Meu tio Alberto era americano.
Não que tenha nascido em Dallas ou Chicago nem em qualquer outra parte dos Estados Unidos. Era americano porque torcia pelo América. O América Mineiro. Na verdade nasceu em Pedra Azul, no Vale do
Jequitinhonha, norte de Minas. Tampouco nós o chamávamos de tio Alberto, em
bom mineirês, dizíamos “Ti Beto”.
Sempre que me lembro dele o vejo
como torcedor do América. E também recordo dois episódios futebolísticos como
centro de nossa curta e esparsa relação. Assisti com ele, em sua casa no Padre
Eutáquio, um jogo Atlético e Portuguesa em 1970. Recordo, ainda hoje, detalhes
daquele jogo. E o principal; ganhamos. Outra vitória do Galo que vimos juntos
foi bem mais importante: a final do primeiro Campeonato Brasileiro em 71. Dessa
vez foi em minha casa, na Barroca. Ele, que não era muito de visitas, apareceu
por lá minutos antes da decisão histórica e lembro de ter ficado feliz por ter
companhia masculina para afrontar a viril angústia daquela final jogada no
Maracanã contra o Botafogo, time cheio de craques. Quando morreu, eu andava
pelos 18 anos e não tivemos tempo de fazer uma amizade de adultos mas o tipo de
família daqueles tempos nos tornava, de alguma maneira, próximos.
Com o passar dos anos ficou
quase impossível ouvir falar do América e não me lembrar de Ti Beto. Assim tem
sido nas últimas semanas com a re-inauguração do Estádio Independência que
agora será administrado por uma empresa paulista em parceria com Atlético,
América e o governo de Minas. Mas, propriedade do América que colocou seu
escudo no gramado atrás das balizas e pintou suas arquibancadas de verde. O Galo vai utilizar o estádio durante o
tempo que durar a reforma do Mineirão.
A reabertura do estádio parece ter trazido sorte para os times mineiros. No jogo inaugural o América venceu o Argentinos Juniors por 2 X 1. Estreando em casa, no Campeonato Brasileiro da segunda divisão, o Coelho também saiu vitorioso, 4 X 0 no CRB. E no último domingo o Atlético venceu o Corinthians por 1 X 0.
A reabertura do estádio parece ter trazido sorte para os times mineiros. No jogo inaugural o América venceu o Argentinos Juniors por 2 X 1. Estreando em casa, no Campeonato Brasileiro da segunda divisão, o Coelho também saiu vitorioso, 4 X 0 no CRB. E no último domingo o Atlético venceu o Corinthians por 1 X 0.
A antiga praça esportiva foi
totalmente demolida, já não restando nada, além dos vestiários, que lembre o
palco da vitória dos EE.UU sobre a Inglaterra na Copa de 50, uma das maiores
zebras de todos os mundiais. Mas ficou o que me parece ser o mais importante: o
nome.
Na verdade seu nome oficial,
enquanto foi propriedade do 7 de Setembro era Estádio Raimundo Sampaio, mas
ficou conhecido por Independência.
O nome do estádio me agrada pois
desde que foi construído o Mineirão, em 1965, todo e qualquer estádio de
futebol inaugurado no Brasil, passou a ser alcunhado por alguma coisa terminada
em ão. Exceção feita ao Beira Rio, ao Morumbi e ao Serra Dourada. Temos Mangueirão,
Frasqueirão, Pinheirão, Barradão, Vivaldão e até o estádio que tem o nome mais
poético entre todos os estádios do mundo, o Rei Pelé, eu já ouvi ser chamado de
Pelezão. Dos ãos eu só perdôo o próprio Mineirão, por ter sido nomeado assim,
espontaneamente, em tom de brincadeira e o Mundão do Arruda por não ser um
aumentativo forçado nem copiado.
Você me dirá que os apelidos têm
a ver com o fato dos nomes oficiais dos estádios serem fruto dessa mania de
homenagear gente detestável ou desconhecida dos freqüentadores de jogos de
futebol. Geralmente políticos. Você tem razão. Quem quer se lembrar de Epitácio
Cafeteira? Ou Clóvis Bezerra? Ou Eduardo José Farah? Mas não se poderia
esquecer essa gente com outros apelidos que não fossem Cafeteirão, Bezerrão ou
Prudentão? Aonde foi parar nosso espírito lírico, nossa verve poética, nossa
sacra sacanagem?
Isso vai escrito, você me dirá,
com pelo menos 40 anos de atraso. E mais uma vez você tem razão. Toda a razão,
pois foi na época da ditadura que mais se construiu estádios e mais se cultuou
a idiotice. Pensando bem, Castelão, Almeidão e Albertão combinam com o
sambão-joia de Benito de Paula e os jurados do Flávio Cavalcanti. Tudo fruto do
mesmo pau, da mesma época. Infelizmente a moda do ão não desapareceu junto com
as calças boca de sino e o DOI-CODI, assim que o belíssimo estádio construído
para os Jogos Pan-americanos do Rio, acabou ganhando o horrível apodo de
Engenhão. Por que não Campo do Botafogo, ou Estádio Suburbano? Eu até admitiria
Estádio Sogrão ou Estádio Múmia da Central, em nome da avacalhação, mas
Engenhão é de lascar. E logo no Rio que estava livre desses nomes por seus estádios
terem sido construídos antes do Mineirão. E também por ser o carioca muito
criativo e sacana para apelidar, seja lá o que for, sem cair em imitações
toscas. Mas se a criatividade andou faltando no
Rio, ela passou longe do interior paulista.
Após adquirir o Mogi Mirim
Esporte Clube, Rivaldo resolveu homenagear o pai dando ao estádio do time, seu
nome. O progenitor do campeão do mundo chama-se Romildo Vitor Gomes Ferreira e
o estádio ficou sendo Romildão. Pelo menos para mim, Romildão é pior que Baetão
ou Nogueirão e faz concorrência ao Brunão de Santo André e ao Suzanão.
O Independência trás de volta, junto
com sua história, um belo nome para um estádio de futebol. Infelizmente nem
toda alegria é completa e o estádio já vem sendo chamado de Arena Independência.
Pois é, agora, após qualquer mão
de tinta que se dá num estádio, ele é rebatizado como “arena qualquer coisa". Não
sei o que difere um estádio de uma arena. Mas a explicação do gosto pelo termo
me parece óbvia: é a mania de imitar-se tudo que é feito ou dito no
estrangeiro. Se existe o Bayern Arena então é lógico que tenha de existir a
Arena Barueri ou a Arena Guanabara em Araruama. Mas tem pior.
Em Chapecó, oeste de Santa
Catarina, a Chapecoense mandava seus jogos no Estádio Índio Condá. Sempre
gostei do nome, incomum nessas terras que preferem homenagear patronímicos
gringos. Mas a atual diretoria, após a mão de tinta e a troca de uns chuveiros nos vestiários, rebatizou o
estádio como Arena Condá. Tiraram o “Indio”, termo demasiado étnico, e adotaram
“arena”, mais moderno e internacional na visão de seus provincianos diretores. O
provincianismo a que me refiro não é geográfico e sim mental.
Mesmo antes de ser erguido, o
estádio do Corinthians já foi batizado informalmente de Itaquerão. O nome
medonho será adotado pelos torcedores em substituição ao oficial que terá, após
o “arena”, a marca de quem pague mais por ostentar seu logotipo ao lado do
emblema mosqueteiro. Teremos então a “Arena Coca-Cola” ou “Arena Casas Bahia” Vão
perder, em nome do faturamento, a oportunidade de homenagear Sócrates, um de
seus maiores ídolos e símbolo do momento mais importante do clube, a democracia
corinthiana. Seria justo e belo que o novo estádio fosse chamado de Sócrates Brasileiro
e aí sim, o apelido seria natural e veríamos a abertura da Copa no Magrão.