segunda-feira, 14 de julho de 2014

O paletó do Falcão



Sob o comando de Telê Santana, a seleção brasileira perdeu duas copas seguidas. Em 82 a seleção brasileira encantou o mundo com um futebol poucas vezes visto numa copa do mundo. Já em 86 as coisas se complicaram. Zico machucado, Júnior tropeçando na mascara e Sócrates inventando a maneira mais pernóstica de se bater pênaltis. Ainda assim só fomos eliminados nos pênaltis pela França de Platini.
A demissão de Telê não causou surpresa. Entre os argumentos que foram usados para justificar sua saída, estava o de que ele era pé frio. Pois é, termos como pé frio, iluminado e predestinado fazem parte do vocabulário de nossa imprensa esportiva. Não só do vocabulário como de seu conjunto de valores. Para substituir Telê foi chamado Sebastião Lazaroni. Este sim, um pé quente.
Tri campeão carioca por dois times diferentes (Flamengo e Vasco), Lazaroni, encarnava o “vencedor”. Depois de conquistar a copa América em 89, o homem das entrevistas que ninguém entendia levou para o mundial da Itália uma das mais fracas seleções que tivemos. Caímos nas oitavas de final para a Argentina, depois de uma difícil classificação na fase de grupos.
De Lazaroni ficou apenas sua frase imorredoura: “A seleção brasileira precisa galgar parâmetros.”
A campeã daquele torneio foi a Alemanha. No banco, regendo os campeões, estava Franz Beckenbauer envergando elegante paletó e dirigindo uma equipe de futebol pela primeira vez em sua vida. Na mesma copa Paulo Roberto Falcão fazia sua estréia como comentarista. Com sua voz de piloto brasileiro de fórmula 1 e seus comentários moderados, no melhor estilo rede globo, Falcão  ganhou admiradores.
Na hora de substituir Lazaroni a escolha parecia óbvia para cartolas e palpiteiros: Falcão era o nome adequado.
O modelo a ser seguido tinha de ser o alemão e Falcão vestia paletós maneiros como Beckenbauer e também nunca fora treinador. Tudo coincidia.  Não tinha erro.
Ainda me lembro de um comentário de Elias Júnior, que naquela época disputava com Datena a honra de manusear o saco do Luciano do Vale. Dizia o pequeno puxa:_ Não vamos ver mais agasalhos deselegantes no banco de reservas.

O cara tava fascinado com o paletó do Falcão. 

Cartolas podres, e o quê mais?



A estrutura do futebol brasileiro é podre. Desde sempre foi podre. Desde sua aparição entre nós. O futebol começou no Brasil como coisa da elite. Manteve enquanto pode seu veio racista, seu preconceito de classe social. Entre os grandes países futebolistas da América do Sul foi o último a se profissionalizar.
Já em 1930, no primeiro mundial, uma briga entre as federações carioca e paulista impediu que mandássemos para o Uruguai nossos melhores jogadores e apenas os cariocas nos representaram. Havia sim um rebelde paulista que fez parte do elenco e que depois de retornar foi punido pela federação de seu estado.
Vieram os tempos áureos. Craques brotavam feito água, principalmente entre as classes pobres da população, entre os negros. O público enchia os estádios. Vieram os títulos. Vieram sob a desconfiança dos dirigentes que não acreditavam no futebol brasileiro, nos nossos jogadores. Principalmente depois da derrota em 50. Vieram apesar deles.
Depois da vitória na Suécia, o cartola mor da época, Paulo Machado de Carvalho foi falar com Nilton Santos que não sabia o que dar aos jogadores. Como não acreditavam na vitória da seleção brasileira não haviam estipulado nenhum prêmio, nem haviam pensado no assunto.
A estranha numeração que a seleção usou naquele mundial veio também da desatenção dos dirigentes que mandaram apenas os nomes dos atletas para a FIFA nas vésperas do torneio. Conta a lenda que foi um jornalista uruguaio, que andava pela Suíça naqueles dias, quem passou a numeração para a federação internacional. 
Como nem imaginaram que a seleção brasileira pudesse ir a final,  esqueceram-se de levar um segundo uniforme que não tivesse as mesmas cores dos anfitriões. Improvisaram a camisa azul lá mesmo e Paulo Machado de Carvalho, escondendo a própria incompetência, inventou a história que o azul era a cor do manto de Nossa Senhora e blá blá blá. Já ouvi dizer também, que levaram a camisa branca, que ficara amaldiçoada depois de 50, como segundo uniforme. 
Depois de apodado de “o general da vitória”, o dirigente relapso virou nome de estádio e recebe, até hoje, da imprensa e dos cartolas que o sucederam, todas as homenagens.
No entanto, a incompetência dos cartolas e seus interesses escusos, não conseguiram derrotar o futebol brasileiro. Em 70, fomos campeões quando a CBD era quase um apêndice da ditadura e sob a direção de Ricardo Teixeira, que disputa com Havelange o título de figura mais daninha do futebol brasileiro, ganhamos mais duas taças.

Ou seja, a derrota humilhante para a Alemanha e a conseqüente eliminação da copa desse ano tem de ter outra explicação que não apenas a podridão e incompetência dos dirigentes. 

A vitória alemã e as falácias da imprensa



Depois da derrota em 66, a crônica esportiva brasileira foi unânime (ou quase) em afirmar que a seleção brasileira estava destinada ao fracasso por não praticar o futebol-força. Esse era o futebol do futuro e fizera sua estréia nos gramados da Inglaterra. Durante algum tempo ouviu-se essa ladainha nas mesas redondas de domingo à noite.
Nem mesmo Pelé era poupado de ácidas críticas dos comentaristas daquela época. Ainda me lembro bem de um mantra que era repetido em tom de verdade absoluta pelos ‘especialistas’ em futebol: Pelé era fruto dos meios de comunicação. Bom mesmo tinha sido o Zizimo.
João Saldanha foi afinal convidado para dirigir a seleção nacional que disputaria as eliminatórias para o mundial do México.
Saldanha, que não era do time dos vira-latas e xenófilos, convocou uma seleção com o que havia de melhor no futebol brasileiro. Nomes como Gerson e Carlos Alberto não eram do agrado da CBD e de seus dirigentes, mas o João Sem Medo deu logo a capitania da seleção ao Carlos Alberto e encerrou a discussão.  
Saldanha mandou o futebol-força às favas e sua seleção, depois dirigida por Zagalo, é até hoje o símbolo do futebol arte, do jogo bonito.
Depois da acachapante derrota para a Alemanha, passa o mesmo. De uma hora para outra, nossa imprensa descobriu que não jogamos nada, que nossos técnicos são umas bestas, e que estamos fadados a novos vexames futebolísticos se não copiarmos modelos estrangeiros e importarmos um técnico.
Os mesmos comentaristas que tanto falavam da falta de obediência tática de nossos jogadores, que só a adquirem quando vão jogar na Europa, agora reclamam da falta de brilho individual e iniciativa pessoal desses mesmos jogadores. Não querem ver que quem os transforma em robozinhos marcadores e escravos de esquemas são os técnicos europeus e seus seguidores daqui, que apoiados pela imprensa vira-lata, deram de exigir de qualquer menino que inicia no futebol, a total ausência de molecagem, a mais completa submissão aos esquemas.
Nossa crônica esportiva, especialmente o pessoal da ESPN Brasil (?), deu de falar dos modelos europeus de administração do futebol como se esses fossem isentos de máculas. Esquecem-se que a Inglaterra, a Espanha e a Itália (que possuem as três ligas mais importantes da Europa) foram eliminadas na primeira fase do mundial. A Itália pela segunda vez consecutiva. Que a Rússia, com seu técnico importado (Capelo) teve o mesmo fim. Portugal também. Agora a Alemanha é o novo modelo a ser seguido, tanto no campo quanto fora dele quando de futebol se fala.
Ano passado (ou no anterior, não estou bem certo) descobriu-se na Alemanha uma máfia que manipulava resultados do campeonato daquele país. O presidente da federação alemã minimizou o episódio dizendo que a quantidade de jogos comprovadamente manipulados eram poucos. Ora, um único jogo cujo resultado é manipulado pode comprometer todo o campeonato. Pode falsear a verdade esportiva.
Quando eu soube desse caso entrei na página eletrônica da ESPN Brasil (?) para ver o que encontrava e o único jornalista daquela emissora a se pronunciar sobre o assunto foi o alemão Gerd Wensel. Obviamente, a emissora, que transmite o campeonato alemão, não quis nos mostrar que o seu “produto” carecia de credibilidade.

Ainda a pouco, enquanto os alemães comemoravam a conquista da copa no gramado do Maracanã, o narrador e bobo da corte, Paulo Andrade, não economizou nos elogios à seleção campeã. Não ficou no terreno do campo e bola, ele foi além e falou por minutos sem fim de como os alemães planejaram a conquista. Esmiuçou, deu detalhes. Quem o escutou deve ter pensado: _Vai entender assim de futebol alemão na casa do caralho.

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Mais um gênio se despede da copa



Outro dia, no jogo entre Costa Rica e Holanda, o técnico Van Gaal surpreendeu a todos ao substituir o goleiro da seleção laranja nos últimos segundos da prorrogação. Entrou o reserva Krul, que talvez não seja tão seguro nos outros fundamentos, daí ser o reserva, mas tava na cara que o técnico confiava nele para as cobranças da marca fatal.
E não deu outra: o homem pegou dois dos tiros livres desferidos pelos costarriquenhos e classificou a Holanda para a semifinal.
Ontem, no jogo contra a Argentina, quando as duas seleções pareciam ter abdicado de querer ganhar no tempo normal e na prorrogação e a disputa por pênaltis parecia inevitável, todos esperavam ver novamente a substituição do goleiro.
Se na partida contra a Costa Rica a entrada de Krul, nos momentos finais do jogo, causou algum desconforto e temor nos cobradores da Costa Rica, contra os argentinos causaria muito mais, afinal a competência do goleiro reserva estava testada e comprovada. O fator psicológico estaria contra os argentinos.
Mas o que fez Van Gaal no início da prorrogação quando lhe restava a última substituição a fazer? Trocou o centroavante. Tirou Van Persie e colocou Huntelaar como se quisesse ganhar o jogo, como se sua seleção tivesse dado algum indício de que queria isso em algum momento da sonolenta partida. Não ganhou. Huntelaar ficou tão solitário no ataque holandês quanto Van Persie esteve durante todo o jogo.
Veio a inevitável cobrança dos tiros livres e Cilessen, que todos sabiam não ser o preferido do treinador nesse quesito, não pegou nenhum dos quatro que foram chutados pelos argentinos.
Van Gaal, que por uns dias foi bestial, vai embora deixando a impressão que é uma besta.


segunda-feira, 7 de julho de 2014

Os mascotes da copa



Não tem mistério: a grande maioria da população pobre do Brasil é negra ou mulata e entre os ricos, quase todos são brancos. A classe média negra, se bem que esteja em crescimento, ainda é pequena. Daí, não ver-se negros nos estádios da copa, mais notadamente nos jogos da seleção brasileira. Os ingressos são caros e nossa  desigualdade social tem cor.
Mas se a questão sócio-econômica explica a cor da platéia que assiste aos jogos, não há o que explique a ausência, quase total, de mascotes negros nas cerimônias de abertura. Ou há?
Quem escolheu a desigualdade baseada na cor da pele, foram as elites brasileiras, foram mais de 300 anos de escravidão. Mas quem escolhe os meninos que acompanham os jogadores na cerimônia que antecede aos jogos da copa? Serão os mesmos que banem os negros de nossa televisão, do nosso cinema, da publicidade? Acho que sim.  
São os mesmos que tentam afastar o negro das universidades, dos cargos públicos de relevância, da entrada principal dos edifícios. São os anti-cotas, os racistas enrustidos que insistem que não há racismo no Brasil. São os mesmos que definem como paranóico quem tente tocar no assunto.

Essa gente que escolheu os mascotes da copa é a negação do Brasil. 

domingo, 6 de julho de 2014

O técnico da seleção.



Desde os anos 30, a seleção brasileira vem brilhando em mundiais. Naquele decênio fomos 3º colocados em 38. Nos anos 40, não houve copa. Nos anos 50 fomos vice em 50 e campeões em 58. Nos anos 60 fomos campeões em 62. Começamos os anos 70 sendo campeões e mostrando a maior seleção que o mundo viu jogar. Depois vieram o 4º lugar em 74 e o 3º em 78.
Os anos 80 foram ruins para nossa seleção, mas ainda assim levamos para a Espanha jogadores que estão, até hoje, entre os melhores de todos os tempos. Em 82, ainda que tenhamos saído prematuramente do mundial, ainda deu tempo para meter 3 X 1 na Argentina numa das maiores exibições já vistas de uma meia cancha.
Vieram os anos 90 e fomos campeões em 94 e vice em 98. Os anos 2000 nos trouxeram o título de 2002 e agora, na segunda copa dos anos 10, já estamos entre as quatro melhores, de novo.
Ou seja, em 20 mundiais disputados, estivemos entre os 4 melhores por 11 vezes, disputamos 7 títulos e ganhamos 5. O mesmo número de títulos que têm Argentina, Inglaterra, Espanha e França, juntas.
Por que escrevo sobre esses fatos tão sobejamente conhecidos? Bem, primeiro para me ufanar e depois para relembrar o que parece esquecido por nossos neo jornalistas esportivos: todas essas conquistas tiveram à frente um técnico brasileiro.
Nunca importamos técnico para comandar nossa seleção, assim como nunca naturalizamos nenhum jogador para defender nossas cores. Ao contrário, por exemplo, da Itália que sempre teve um estrangeiro naturalizado entre seus campeões mundiais. Mas voltemos aos técnicos.
De uns tempos para cá, os neo comentaristas esportivos deram para advogar pela vinda de um selecionador estrangeiro para dirigir a seleção brasileira. Eles não especificam qual a nacionalidade desse estrangeiro. Como falam, fica parecendo que tanto faz, desde que seja estrangeiro. Se vem da Inglaterra, do Burundi ou da Nicarágua, não importa. Há de ser estrangeiro. Alegam que nossos técnicos estão atrasados, defasados com relação aos estrangeiros. Que são boleiros e não participam de simpósios, palestras e cursos sobre futebol que são ministrados pelos novos gênios das táticas e das estratégias mundo a fora.
E aí vem o mundial. E o que vemos? Nossa seleção, comandada por um técnico brasileiro, novamente entre as 4 melhores do mundo e os gênios estrangeiros assistindo pela televisão.


quinta-feira, 3 de julho de 2014

A Copa na imprensa



No dia seguinte ao da derrota da seleção espanhola para a holandesa, o diário El País, que se pretende um jornal sério, gastou títulos e muito espaço de sua versão digital com um artigo de um matemático que expunha sua tese sobre o sorteio de FIFA para a copa. O sistema atual é considerado injusto pelo homem dos números, Dizia ele que deveria seguir-se outro critério que não o adotado pela entidade. Ele sugeria o ranking da FIFA como parâmetro. E fez suas simulações que ocupariam página inteira se fossem publicadas em papel jornal. (Não sei se foram.) Antevendo o desastre, o matemático exigia mudanças urgentes. Os leitores do periódico não gostaram nada. No país com o maior desemprego da Europa, seus habitantes querem outras reformas urgentes e não a do sorteio da FIFA para o mundial.
O sítio informativo “24 horas” do México, depois da choradeira pela derrota contra os mesmos holandeses, publicou uma matéria cujo título era: _Hoy si, ganó México. Trata a dita matéria, que veio com foto de corpitcho inteiro do sarado atleta, de uma medalha de ouro conquistada na emocionante modalidade da ginástica aeróbica. Parece que o esporte mexicano não anda ganhando muita coisa ultimamente.

A imprensa uruguaia, depois que Luisito Suárez foi enjaulado e vacinado, só fala de punições. Para os jornalistas daquele país, todos deveriam cumprir suspensões. Do massagista ao ponta esquerda de todas as seleções, inclusive as que já se foram do mundial, todos deveriam ser punidos como se fossem contumazes mordedores. Não faltam fotos de Suárez, com filhinho no colo e cara chorosa adornando os periódicos e até mesmo o presidente uruguaio, o simpático Mujica, teve sua desastrosa manifestação contra a FIFA reproduzida em todas as capas.