Há alguns anos, li o livro “O negro no Brasil”. Creio que o
sobrenome do autor é Chiavenato. Gostei do livro e recomendo. Só encontrei um
senão. Na verdade, o embrião de um senão. Foi quando o autor tratou da
libertação dos escravos em 1888. Diz ele que eram “apenas” 700 ou 900 mil
pessoas que se encontravam naquela situação. Diante dos milhões que sofreram a
escravidão durante mais de 3 séculos, o número parece pequeno. Ora, mas não são
números, são pessoas. Com a intenção de destruir o mito da princesa generosa,
Chiavenato (se é que esse é mesmo seu nome) diminui o impacto que a libertação
teve na sociedade e, principalmente, na vida daqueles recém-libertos.
Estou longe de ver a libertação assinada pela princesa como
uma benesse do poder ou das elites brasileiras. O sistema escravista do Brasil
já parecia algo grotesco mesmo para as nações que se aproveitaram ao extremo da
compra, venda e exploração dos negros. Ademais, as lutas travadas por
quilombolas, escravos libertos e por parte da elite esclarecida, já havia posto
um fim moral no escravismo do Brasil.
Mas veio a Lei Áurea e a instituição indefensável foi
extinta.
Outro dia, acompanhei os comentários que Mauro Iasi,
candidato à presidência pelo PCB, fazia durante os debates da Bandeirantes. Num
determinado momento, Iasi fala sobre os projetos sociais e da eficácia, ou
falta dela, do programa bolsa família. Diz o líder comunista que as pessoas
atendidas saíram da miséria absoluta para a miséria. Reclama de políticas de
longo prazo que combatam essa miséria.
Não deixa de ter razão o candidato do PCB, há que se ter
políticas de longo prazo para o drama da miséria em nosso país. Mas o que é a
miséria absoluta, a miséria extrema? É não ter o que comer, é comer calango e
rato na caatinga, é comer o lixo das feiras e restaurantes nas grandes cidades,
é mendigar todo o dia para comprar um pastel ou um pão. Miséria extrema é ver
os filhos morrendo por inanição, é ter a cabeça girando pela fome, é morrer de
velhice aos 40.
Não acho desprezível tirar milhões de pessoas dessa situação.
Ainda que um imenso contingente de brasileiros continue a viver em condições
miseráveis, sem habitação digna, sem emprego decente, sem condições de higiene,
o fato de ter o que comer alimenta a esperança, dá alguma perspectiva, livra o
homem, a mulher, a criança da luta por manterem-se apenas vivos.
Mauro Iasi é um sujeito dos mais corretos, um lutador, um
cara que não se acomodou diante da iniqüidade existente no país. Mauro Iasi
quer melhorar o Brasil para os brasileiros, para os brasileiros mais pobres,
mas sua critica ao programa de governo que mata a fome é injusta. Iasi, assim como
Chiavenato, se esquece que detrás dos números existem pessoas. Esquece de
interrogar as pessoas que saíram da pior das condições de vida. Seu discurso é
lógico, mas carece de empatia com os que passam fome.
Aqueles escravos libertos em 1888, não foram viver nenhum
paraíso, pelo contrário, foram vivenciar a miséria. Mas existe maior miséria
que não ser dono de si mesmo? Hoje, os
descendentes daqueles libertos e tantos outros brasileiros vivenciam a
escravidão da fome e os governos do PT os tem libertado.
Ainda que não tivesse outros motivos para votar em Dilma no
segundo turno, o combate à miséria extrema no país que teve início no governo
Lula, e que ela dá prosseguimento, seria o suficiente.
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