quarta-feira, 6 de maio de 2015

Ziraldo







  



Numa entrevista que assisti há alguns anos, Ziraldo contava a história de um empregado de seu tio. Dizia o autor do Menino Maluquinho que o tal empregado vivia doente, numa inaptidão pro trabalho de dar nojo. Molenga e sorumbático. Um dia o homem foi ao dentista e extraiu o resto de dentição que ainda tinha. O protético meteu-lhe na boca uma dentadura. Milagre! O sujeito se tornou um trabalhador de primeira. Prestimoso e incansável. Eram os focos dentários que lhe tiravam o ânimo e a força.
Ziraldo contava a história familiar para se contrapor à fluoretação da água. Dizia ele que aquilo era bobagem e preconizava a extirpação dentária. Claro, não para seus filhos, netos ou bisnetos, não para os de sua classe social, mas para os pobres que padecem com as afecções bucais. Confesso que me chocou a falta de sensibilidade do cartunista genial, mas quem nasce e vive na classe social em que nasci e vivo já se acostumou a ouvir de pessoas que admira comentários desse naipe. Deixei pra lá.
Agora Ziraldo falou dos homossexuais. Falou as mesmas bobagens que os Bolsonaros, Malafaias e Felicianos falam. Criticou Fernanda Montenegro pela interpretação de uma personagem homossexual. Ouvir ou ler isso de alguém ligado à arte foi o mais chocante. De resto, nada me surpreendeu. Fui leitor do Pasquim desde meados dos 70 e bem me lembro de tirinhas que faziam piadas grosseiras com homossexuais e feministas
Muitos daqueles cartunistas e escritores do Pasquim se fossem questionados hoje sobre o tema da homossexualidade diriam coisas semelhantes àquelas que disse Ziraldo. Tenho certeza disso. Não imagino, por exemplo, o Jaguar com opinião diferente. O fato de terem sido importantes na luta contra a ditadura e serem artistas não faz deles, necessariamente, pessoas progressistas no tocante ao comportamento ou à sexualidade. 
Repito que não me surpreendeu o que disse Ziraldo assim como não me surpreendo com o que diz Caetano quando lhe pedem que faça comentários sobre a política nacional. É como diz o grande compositor baiano: “De perto ninguém é normal.”




Nenhum comentário:

Postar um comentário