Algumas lições podemos tirar da última eleição espanhola principalmente agora, quando discutimos nossa reforma política. Claro que estamos apenas fazendo uma tímida reforma eleitoral, mas, é justamente nesse campo que os espanhóis nos mostram algumas coisas interessantes.
A primeira delas se refere ao comparecimento às urnas. Cerca de 75% das pessoas aptas a votar depositaram seu voto no último dia 20. Se levarmos em consideração que o voto lá é facultativo e não é de se crer que alguém saia de casa para votar nulo ou em branco quando seu comparecimento não é compulsório, verificaremos que o número de votos válidos se aproxima muito com os aferidos no Brasil nas últimas eleições daqui. Seria este um argumento para quem defende o voto facultativo no Brasil. O eleitor depois de tantos anos de obrigatoriedade já se acostumou ao dever cívico e já não seria mais necessário tange-lo para as urnas. Na minha humilíssima opinião esta questão não é tão importante para o aperfeiçoamento democrático. No entanto os números das eleições espanholas mostram que tampouco a obrigatoriedade do voto se mostra necessária.
Outra questão que me parece importante é a da representatividade. È comum, no Brasil, que vozes se levantem para criticar o excesso de partidos representados no congresso nacional. Ao fim das eleições espanholas 13 partidos conseguiram assento no legislativo daquele país. E isto se deu em um momento de grande polarização entre Psoe e PP. A restrição ao grande número de agremiações nas nossas casas legislativas vem acompanhada da proposta, já rejeitada no STF, da cláusula de barreira.
Segundo escutei do advogado e ex-deputado Marcelo Cerqueira, a cláusula de barreira só existe na Alemanha e foi imposta pelo governo de ocupação estadunidense ao fim da segunda guerra mundial, com o intuito de criar dificuldades eleitorais para os comunistas. Aqui seus defensores têm finalidade parecida pois semelhante restrição traria enorme prejuízo aos pequenos partidos de cunho ideológico.
E as lições ficam restritas ao campo, digamos, administrativo pois no que concerne à política os ibéricos demonstraram total incompreensão dos motivos da crise que assola toda a Europa e à Espanha em particular. E nem se trata de algo vindo de passado remoto. Foi ontem mesmo que a bolha imobiliária nos EE.UU detonou a crise que se alastrou pelo mundo por contágio. Governos saíram em socorro dos bancos cujos cofres possuíam mais derivativos e outros papéis podres que o do Tio Patinhas em moedas e cédulas.Nada foi suficiente para estancar a sangria financeira desatada pela falta de regulamentação dos mercados especulativos. Esta desregulamentação era o carro chefe de um modelo econômico neo-liberal que na Espanha tem como seu principal defensor, justamente, o Partido Popular. Vencedor, por acachapante maioria, no pleito de domingo passado tem agora o partido do Sr. Rajoy a faca e o queijo (ou seria o garfo e a paella?) para impor aos trabalhadores daquele país mais sacrifícios a fim de que seus grandes exportadores e casas de agiotagem não sofram com as mazelas criadas por um modelo de política econômica cujos primeiros beneficiários seriam eles mesmos. Creio até que o tamanho da vitória será um incômodo para os liberais espanhóis. Como não haverá necessidade de negociações ou alianças, o ônus do fracasso que se aproxima recairá sobre Rajoy e sua administração. Nos primeiros tempos poderá se sustentar com o discurso da”herança maldita” e continuar usando o nome do canastrão Zapatero para justificar alguma coisa, mas passada a lua de mel o povo irá cobrar pelos sacrifícios feitos e se os espanhóis já demonstraram que votam mal, por outro lado sabem cobrar direitinho.
Dificilmente o novo governo espanhol tomará medidas tão drásticas quanto às tomadas por seus vizinhos portugueses. Se Portugal já estava sob intervenção dos organismos internacionais, a Espanha ainda tem crédito na praça. Crédito que remunera com juros cada vez mais altos. Mas se o tamanho de sua economia é fator de maior autonomia econômica frente aos banqueiros, fica claro que não há dinheiro para salva-los caso isto se mostre necessário.
Por último, as eleições espanholas podem nos ensinar que não adianta um governo dizer-se de esquerda ou progressista, precisa agir como tal. E que as políticas de direita dos socialistas espanhóis, foi o que levou o eleitorado a troca-los pela direita de verdade.