quinta-feira, 3 de abril de 2014

Nossos meninos foram reprovados no teste da OCDE, ainda bem


Um dia, meu pai chegou em casa com uma lata de leite em pó. Isso foi nos anos 60 e o leite era americano. Era o leite da Aliança para o Progresso. Estava escrito, em três idiomas, na lata prateada. Durante algum tempo eu bebi daquele leite. Não só bebi, como o comi, escondido, às colheradas. Foi a primeira vez que provei leite em pó.
A Aliança para o Progresso foi criada em 1960 com um sorriso nos lábios e um porrete nas mãos, como disse Ted Roosevelt, anos antes, referindo-se ao modo como nós, latino-americanos, deveríamos ser tratados. Eram tempos quentes da guerra fria com o caso dos mísseis soviéticos em Cuba, a tentativa de invasão da Ilha por parte dos americanos, entre outros ingredientes.
A tal Aliança era, em suma, uma resposta tosca dos americanos à Revolução Cubana. Uma tentativa de atrair as simpatias dos latino-americanos que, naqueles anos, se dirigiam para os barbudos revolucionários do Caribe. Era o sorriso nos lábios, logo seguido do porrete para os que teimavam em não aceitar a divisão de “um leitinho para você, uma base militar para mim”.
Depois do leite, vieram os golpes de estado patrocinados pelo Tio Sam, decerto usando das “sobras” do gigantesco orçamento da Aliança para o Progresso.
No mesmo ano da criação da Aliança para o Progresso, outro órgão, dominado pelos americanos, mudava de nome. A OECE (criada no contexto do Plano Marshall)  passava a se chamar OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Enquanto a Aliança tentava mudar nossos hábitos alimentares, a OCDE nascia para traçar os rumos da economia de mercado ameaçada pelo comunismo de Fidel e pelos governos progressistas que, em todo o mundo, tendiam para outros caminhos.
Hoje, a OCDE tem 34 membros. São, quase todos, países ricos exportadores de tecnologia e produtos de alto valor agregado. É uma instituição do mercado, para o mercado, pelo mercado. Seu objetivo é desenvolver o mercado, cooperar pelo mercado, pelos interesses de seus membros enquanto mercados. Sua preocupação nunca foi a educação, pelo menos no sentido mais amplo.
No entanto, a OCDE faz testes em jovens de todo o mundo para testar sua capacidade. Capacidade para quê? Ora, para suprir de mão de obra o mercado. No último desses testes, cujo resultado provocou reportagens em todos os meios de desinformação do país, nossos jovens tiveram fraco desempenho. Nossos meninos de 15 anos não souberam resolver questões práticas como marcar lugares de convidados numa mesa respeitando uma certa ordem ou comprar passagens de trem mais baratas usando uma máquina de auto atendimento.
Ora bolas, um menino dessa idade não organiza jantares, nem pode viajar sozinho. Um menino dessa idade deve aprender a manejar conceitos, tirar conclusões de fatos, escrever corretamente e namorar. Mas não é isso o que espera o mercado dos jovens de 15 anos. A OCDE está pouco se lixando para a felicidade dos meninos. A OCDE os quer práticos, diligentes, produtivos e prontos para o mercado de trabalho. Engravatados e competitivos.
Muito embora a OCDE nunca tenha se notabilizado por nenhuma iniciativa no campo educacional, nossa imprensa deu um enorme peso ao teste aplicado pela instituição em mais de 80 mil jovens em 44 países. Nas TVs vimos as Leilanes Neubarch  da vida, fazendo carinha de inveja pelos altos índices de aproveitamento dos orientais, estes sim, prontinhos para o mercado de trabalho nos padrões da OCDE.

Nossa educação tem sérios e profundos problemas. Não há como negar, mas não é a OCDE e seu teste imbecilizante que devem servir de parâmetro para o questionamento que devemos fazer sobre o que devem aprender nossos meninos. 

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