A frase era bonitinha e apareceu
no facebook várias vezes. Tal qual uma personagem de romance eu tratava de dar
um rosto, um corpo, uns modos à frase. Não a quem a dissesse, mas à própria
frase. A composição foi simples: meti-lhe uns tênis nos pés e uma goma de mascar na boca.
Dei-lhe também uma pele bronzeada e as devidas marquinhas da alça do biquini.
(Sempre gostei das marquinhas e hoje tenho obsessão por elas. Acho que se lesse
os Irmãos Karamazov por primeira vez nesses dias, minha Grushenka teria
marquinhas de biquini). Matriculei-a num cursinho e comprei pra ela, muito a
contra gosto, um smartphone. A frase era obviamente adolescente.
Já vestida e sem largar o
maldito smartphone já posso lhe apresentar a frase. Ei-la: “Eu não guardo nem
dinheiro, pra quê vou guardar rancor.” Ora, querida não há motivo para que você
guarde dinheiro. Os tênis, o smartfone e seu tempo livre para a praia eu já lhe
dei. Pago a mensalidade do cursinho e quantas gomas de mascar você puder botar na boca. Mas
quanto ao rancor, guarde-o. Não ande por ai desperdiçando sentimentos, principalmente
os de forte teor alcoólico e humano.
Guarde seu rancor e trate-o bem.
Dê-lhe vodka, cachaça, vinho barato, muitos cigarros e um pires de leite pela
manhã.Crie o rancor em estreita amizade com seu primo mais velho, o ódio e verá
que eles combinam e tramam. Fique sendo apenas “eu não guardo nem dinheiro” e
poderemos ser amigos.
Só quem cultiva robustos
rancores é capaz da verdadeira gratidão assim como só os que odeiam fortemente
são capazes de amar até as últimas conseqüencias.
O ódio, de tanto beber, é bem
capaz de morrer jovem, mas o rancor não. Ele pode sobreviver até mesmo a você e
talvez seja seu único e derradeiro amigo.
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