terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Adeus







Morreu Joãozinho Trinta e com ele uma página do carnaval carioca.
Sua trajetória como carnavalesco é uma das mais vitoriosas na história do carnaval..Depois de iniciar como assistente no Salgueiro onde foi campeão em 65, 69 e 71, trabalhou em 73 ao lado de Maria Augusta e 74, já como solista, conquistou o título para a escola da Tijuca, bisando no ano seguinte.
Em 1976 levou a Beija Flor ao topo no desfile das escolas e depois repetiu o feito em 77 e 78. Conquistou também, pela “orgulho da baixada”, os títulos de 80 e 83. Sua passagem pelo carnaval de Nilópolis foi tão vencedora quanto polêmica. Criticado por sambeiros, politicólogos e outros palpiteiros, pelo luxo que sua escola colocava na avenida, em contraste com a realidade das comunidades das quais as escolas eram oriundas, o maranhense da baixada fluminense foi categórico ao afirmar que “pobre gosta é de luxo, quem gosta de miséria é intelectual”. Faltou dizer que intelectual gosta de miséria dos outros. Também bateu de frente com a igreja católica quando vestiu uma imagem do Cristo redentor de mendigo no seu enredo “Ratos e urubus, larguem a minha fantasia” Foi impedido e teve que cobrir a alegoria com um plástico preto mas não deixou por menos e sobre a veste que a censura eclesiástica impôs, escreveu os dizeres:_”Mesmo censurado, rogai por nós”.
Pela Acadêmicos da Rocinha foi campeão nos grupos 1D, 1C e 1B em 89, 90 e 91. Também venceu o acesso pela Império da Tijuca em 76. Voltou a conquistar o título do grupo especial em 97 pela Viradouro. Entre o carnaval carioca e o paulistano somou também 6 vice-campeonatos.
De Joãozinho Trinta guardo uma história contada pelo Neguinho da Beija Flor que ouvi numa entrevista há alguns anos. Contava o cantor que estava à porta de sua casa um domingo de manhã quando Joãozinho Trinta,.que ia para a feira, parou para uma conversa e disse ao compositor que tem a escola no nome e na história:_Olha Neguinho, todas as grandes escolas têm um samba que as exalta e nós não temos esse samba. Você, como um dos compositores mais famosos da escola, deveria fazer algo a respeito.  Despediu-se e foi comprar limões à feira.
Neguinho da Beija Flor entrou em casa e encontrou a lira e a musa e naquele mesmo instante começou a escrever o samba exaltação que lhe cobrara o carnavalesco.Voltou ao portão e quando Joãozinho Trinta retornava de suas compras, mostro-lhe o samba recém composto. Cantava olhando para o papel onde estava a letra ainda cheirando à tinta. Quando levantou os olhos para colher a aprovação de Joãozinho Trinta os olhos deste estavam cheios de lágrimas.
Sobre todas as glórias conquistadas e polêmicas causadas, para mim essa história define mais Joãozinho Trinta que qualquer outra.

Um comentário:

  1. No mesmo dia em que se foi o Trinta - curiosa coincidência que vai fazer lembrar a todos juntos - foram-se também o Sérgio Brito, síntese do teatro brasileiro em 60 anos de palco/cochia/câmeras, e a caboverdeana Cesária Évora, grande voz da música popular africana de expressão portuguesa em meio século. Joãozinho assumiu que o desfile de samba carioca é ópera, quer mais? Sérgio fazia de cada criação uma obra decisiva - tenho gravadas na memória suas atuações no Grande Teatro Tupy dos anos 50 e, especialmente, um Tchekhov encenado no Teatro Opinião, no Bairro Peixoto. Dona Cesária mostrou que o Brasil e o português são mais africanos e que o fado tem mais infiltrações na música daqui e d'África do que se pensa. Joãozinho, Sérgio, Cesária, grande trabalho!

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