sábado, 14 de janeiro de 2012

Dois julgamentos








          . Até que sejam lançadas as candidaturas para as prefeituras e muito antes que vejamos o desfile de folclóricos candidatos à vereança, no programa eleitoral gratuito, a vida política do país está pendente do Supremo. Trata-se da lei da ficha limpa. Já não se cuida da anualidade, pressuposto para sua aplicação, segundo a visão da maioria dos ministros daquela casa de justiça. Irão agora, os ministros da corte, esmiuçar os diversos artigos que compõem o diploma.
Uma associação de profissionais liberais não concorda, por exemplo, com o artigo que dá como inelegível, profissional que tenha perdido o direito de exercer a profissão, por entendimento dos órgãos de classe, ainda que esses órgãos e conselhos tenham tido durante sua existência, um comportamento nitidamente corporativista. Basta ver o número de denúncias contra a má conduta médica e as punições resultantes dessas denúncias. O número de profissionais que recebem punição, mesmo que essa seja apenas uma advertência, é mínimo. Comparando denúncias e punições, resultaria claro, para quem não conhecesse o espírito de corpo desses conselhos, que a população tem verdadeira implicância com seus doutores. A tal associação deve crer que uma pessoa que perdeu seu direito de ser profissional em determinada área, por ter cometido falta gravíssima, pode, sem embargo, representar o povo e dar voz às suas reivindicações.
 Por seu turno, a OAB entrou com uma ação declaratória de constitucionalidade, para por fim à insegurança jurídica advinda das diversas interpretações da lei.
Outros temas também serão alvo das deliberações de Suas Excelências. Talvez venha à luz uma questão que foi ofuscada quando, pela primeira vez, se debateu o assunto no STF. Ao ser enviado o texto da Câmara, após sua aprovação, para o Senado, este fez uma modificação, que segundo o senador que relatou a questão na câmara alta, teria por fim, uma simples adaptação ao restante do texto legal. Um tempo verbal foi trocado por outro. Ao ser abordado o tema no STE, a ministra Carmem Lúcia exemplificou e deu como certo que a mudança de redação não alterava o espírito da lei e, portanto,o texto não deveria voltar à casa de origem. Para mim, leigo em direito e gramática, nem de longe a questão está pacificada. O Ministro Lewandowski, que presidia os trabalhos no STE por ocasião das declarações da Ministra, assentiu com seu entendimento. Mas isso não muda muita coisa. Não me lembro de declarações de outros ministros sobre o caso.
A Ministra Carmem Lúcia assim como os Ministros Ayres Brito, Lewandowski e Joaquim Barbosa, são abertamente favoráveis à aplicação da lei de iniciativa popular e mesmo na questão da anualidade, já haviam tomado posição contrária à que foi vencedora por 6 a 5 no julgamento do ano passado. Creio que o quinto voto foi dado pela Ministra Ellen Gracie, já aposentada.   
Caso esta questão venha a ser suscitada, teremos que contar com mais dois votos, alem dos quatro já certos, para a aplicação da lei, ou o que dela sobreviver aos ataques de associações e políticos, ainda este ano. Se voltar à Câmara para nova apreciação, mesmo que não haja manobras protelatórias, a questão da anualidade viria novamente à baila.
Se o julgamento pelo Supremo, da lei da ficha limpa joga holofotes sobre a Corte, podendo eleva-la no conceito dos autores da lei, a sociedade organizada, outro litígio promete pôr a nu a posição de nossos magistrados quanto à transparência de seus atos.
O Ministro Marco Aurélio de Melo concedeu liminar favorável à Associação de Magistrados do Brasil caçando decisões do Conselho Nacional de Justiça. Foi uma decisão simbólica. A liminar foi concedida horas antes de iniciar-se o recesso do judiciário tornando-se inócua em seus aspectos práticos. Também foi simbólica, por ter sido concedida pelo Ministro Marco Aurélio que é francamente a favor de impor-se limitações ao conselho. Várias vezes já escutamos de Sua Excelência que “o judiciário está de joelhos” referindo-se aos pareceres do CNJ.
É certo que a corregedora Eliana Calmon está coberta de razão quando cobra e pune magistrados corruptos ou relapsos. O problema é seu linguajar. Quando quer admoestar, ofende. Quando exemplifica, constrange. Sua truculência verbal, fez com que os magistrados das cortes superiores aderissem à indignação de seus colegas do baixo clero judiciário. Portanto é de se esperar que o conselho seja tolhido em suas atribuições.
Mas se no tocante ao CNJ, uma derrota da sociedade é quase certa, creio que pode haver algum otimismo quanto à lei da ficha limpa. Por um lado temos os Ministro Pelluso, Marco Aurélio, Gilmar Mendes e Toffoli que tenderiam a uma emasculação da lei de iniciativa popular. Por outro, os Ministros Lewandowski, Carmem Lúcia, Joaquim Barbosa e Ayres Brito pela sua aplicação in totum. O Ministro Fux é uma incógnita, pois se foi voto decisivo na questão da anualidade, dando vitória aos que defendiam a tese de sua necessidade, ao julgar apelações individuais, voltou atrás num de seus votos quando se tratou de retroatividade na aplicação da nova lei. O Ministro Celso de Melo, com seu vasto saber jurídico, de certo encontrará na lei algo que mereça correção no que tange aos direitos individuais. A Ministra Rosa Maria Weber, recém empossada, tem evitado comentários sobre o assunto para não ver-se impedida de votar.
Os dois julgamentos, Lei da ficha limpa e CNJ, podem aproximar o Tribunal da população. Meu otimismo não chega a tanto. Acho que vai ser uma no cravo, outra na ferradura.

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