. Até que
sejam lançadas as candidaturas para as prefeituras e muito antes que vejamos o
desfile de folclóricos candidatos à vereança, no programa eleitoral gratuito, a
vida política do país está pendente do Supremo. Trata-se da lei da ficha limpa.
Já não se cuida da anualidade, pressuposto para sua aplicação, segundo a visão
da maioria dos ministros daquela casa de justiça. Irão agora, os ministros da
corte, esmiuçar os diversos artigos que compõem o diploma.
Uma associação de profissionais
liberais não concorda, por exemplo, com o artigo que dá como inelegível,
profissional que tenha perdido o direito de exercer a profissão, por
entendimento dos órgãos de classe, ainda que esses órgãos e conselhos tenham
tido durante sua existência, um comportamento nitidamente corporativista. Basta
ver o número de denúncias contra a má conduta médica e as punições resultantes
dessas denúncias. O número de profissionais que recebem punição, mesmo que essa
seja apenas uma advertência, é mínimo. Comparando denúncias e punições,
resultaria claro, para quem não conhecesse o espírito de corpo desses
conselhos, que a população tem verdadeira implicância com seus doutores. A tal
associação deve crer que uma pessoa que perdeu seu direito de ser profissional
em determinada área, por ter cometido falta gravíssima, pode, sem embargo,
representar o povo e dar voz às suas reivindicações.
Por seu turno, a OAB entrou com uma ação
declaratória de constitucionalidade, para por fim à insegurança jurídica advinda
das diversas interpretações da lei.
Outros temas também serão alvo
das deliberações de Suas Excelências. Talvez venha à luz uma questão que foi
ofuscada quando, pela primeira vez, se debateu o assunto no STF. Ao ser enviado
o texto da Câmara, após sua aprovação, para o Senado, este fez uma modificação,
que segundo o senador que relatou a questão na câmara alta, teria por fim, uma
simples adaptação ao restante do texto legal. Um tempo verbal foi trocado por
outro. Ao ser abordado o tema no STE, a ministra Carmem Lúcia exemplificou e
deu como certo que a mudança de redação não alterava o espírito da lei e, portanto,o
texto não deveria voltar à casa de origem. Para mim, leigo em direito e
gramática, nem de longe a questão está pacificada. O Ministro Lewandowski, que
presidia os trabalhos no STE por ocasião das declarações da Ministra, assentiu
com seu entendimento. Mas isso não muda muita coisa. Não me lembro de declarações
de outros ministros sobre o caso.
A Ministra Carmem Lúcia assim
como os Ministros Ayres Brito, Lewandowski e Joaquim Barbosa, são abertamente
favoráveis à aplicação da lei de iniciativa popular e mesmo na questão da anualidade,
já haviam tomado posição contrária à que foi vencedora por 6 a 5 no julgamento do ano
passado. Creio que o quinto voto foi dado pela Ministra Ellen Gracie, já
aposentada.
Caso esta questão venha a ser
suscitada, teremos que contar com mais dois votos, alem dos quatro já certos,
para a aplicação da lei, ou o que dela sobreviver aos ataques de associações e
políticos, ainda este ano. Se voltar à Câmara para nova apreciação, mesmo que
não haja manobras protelatórias, a questão da anualidade viria novamente à
baila.
Se o julgamento pelo Supremo, da
lei da ficha limpa joga holofotes sobre a Corte, podendo eleva-la no conceito dos
autores da lei, a sociedade organizada, outro litígio promete pôr a nu a posição
de nossos magistrados quanto à transparência de seus atos.
O Ministro Marco Aurélio de Melo
concedeu liminar favorável à Associação de Magistrados do Brasil caçando
decisões do Conselho Nacional de Justiça. Foi uma decisão simbólica. A liminar
foi concedida horas antes de iniciar-se o recesso do judiciário tornando-se
inócua em seus aspectos práticos. Também foi simbólica, por ter sido concedida
pelo Ministro Marco Aurélio que é francamente a favor de impor-se limitações ao
conselho. Várias vezes já escutamos de Sua Excelência que “o judiciário está de
joelhos” referindo-se aos pareceres do CNJ.
É certo que a corregedora Eliana
Calmon está coberta de razão quando cobra e pune magistrados corruptos ou
relapsos. O problema é seu linguajar. Quando quer admoestar, ofende. Quando
exemplifica, constrange. Sua truculência verbal, fez com que os magistrados das
cortes superiores aderissem à indignação de seus colegas do baixo clero
judiciário. Portanto é de se esperar que o conselho seja tolhido em suas
atribuições.
Mas se no tocante ao CNJ, uma
derrota da sociedade é quase certa, creio que pode haver algum otimismo quanto
à lei da ficha limpa. Por um lado temos os Ministro Pelluso, Marco Aurélio,
Gilmar Mendes e Toffoli que tenderiam a uma emasculação da lei de iniciativa
popular. Por outro, os Ministros Lewandowski, Carmem Lúcia, Joaquim Barbosa e
Ayres Brito pela sua aplicação in totum. O Ministro Fux é uma incógnita, pois
se foi voto decisivo na questão da anualidade, dando vitória aos que defendiam
a tese de sua necessidade, ao julgar apelações individuais, voltou atrás num de
seus votos quando se tratou de retroatividade na aplicação da nova lei. O
Ministro Celso de Melo, com seu vasto saber jurídico, de certo encontrará na
lei algo que mereça correção no que tange aos direitos individuais. A Ministra
Rosa Maria Weber, recém empossada, tem evitado comentários sobre o assunto para
não ver-se impedida de votar.
Os dois julgamentos, Lei da
ficha limpa e CNJ, podem aproximar o Tribunal da população. Meu otimismo não
chega a tanto. Acho que vai ser uma no cravo, outra na ferradura.
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