Na próxima semana santa faz dezenove
anos que vivo em
Garopaba. Lembro bem da data pois poucos dias depois de
chegar, voltei ao Rio para buscar umas coisas e votar no referendo que foi
realizado dia 21 de abril de 1993. Como se sabe, o primeiro referendo ninguém
esquece. E esse era diferente do último havido no país 30 anos antes.
Para começar, a pergunta feita
aos eleitores era incorreta. Confundiram forma de governo com sistema de
governo. Devíamos optar entre a manutenção do presidencialismo, ou a adoção do
parlamentarismo ou da monarquia. Acho que a pergunta deveria ter sido dividida em duas. Primeiro o
eleitor optaria entre república ou monarquia. Vencendo, por exemplo, a
monarquia, o eleitor deveria voltar às urnas e decidir que tipo de monarquia
preferiria, parlamentarista ou absolutista. No caso da vitória do sistema republicano,
escolheríamos em segunda votação entre república presidencialista ou república
parlamentarista.
Durante a campanha eleitoral
gratuita a que tiveram direito, monarquistas e parlamentaristas (embora uma
coisa não exclua a outra, sigo o roteiro dos propositores do referendo) não se
cansavam de citar nações estrangeiras que viviam felizes livres do
presidencialismo. Claro que nenhum monarquista se lembrava de citar a Arábia
Saudita ou algum emirado do golfo pérsico. Tampouco os parlamentaristas se
referiam às crises de governo pelas quais, países como a Itália, sempre
passavam
Entre os que propunham a volta
ao século 18, estava Hugo Carvana. Os Orleãns e Bragança, por direito divino,
já entregavam títulos e comendas a rodo e Amaury Júnior entrevistava em seu
programa, os agraciados.
Os parlamentaristas eram
capitaneados por Fernando Henrique Cardoso que talvez ainda não acreditasse
numa eleição sua para a presidência. Ele que já perdera a disputa pela
prefeitura de São Paulo para o cadáver de Jânio Quadros, ambicionava a chefia
de governo pela via transversa do parlamento. Ao ser eleito e reeleito
presidente, tanto ele como seu partido esqueceram o assunto. Hoje, que o horizonte
eleitoral se mostra distante para os tucanos, talvez seja hora de voltar com a
velha cantilena parlamentarista. Mas não contem com o Aécio.
Há que se reconhecer que na
Europa o parlamentarismo funciona. Mas não sem percalços. Basta ver o caso da
Bélgica que ficou mais de um ano sem chefe de governo porque os partidos mais
votados nas eleições gerais, não conseguiam fazer alianças que formassem
maioria. Lá o fator de discórdia é, e sempre será, a divisão de francófonos e
flamengos. É problema específico mas que encontra paralelos em outras nações.
Mas o funcionamento do sistema se dá devido ao forte aparelho burocrático
estatal. Li certa vez que na Inglaterra havia 200 cargos comissionados enquanto
que no Brasil são mais de 50 mil segundo a imprensa. Mesmo nos Estados Unidos,
exemplo de presidencialismo duradouro, esses cargos de confiança não passam de
2 mil. Fica claro que sem uma burocracia forte e profissional nem se pode
pensar em
parlamentarismo. Nos anos 70 e 80, a Itália teve mais
primeiros ministros que a Bolívia presidentes, mas o estado funcionava
normalmente ou quase isso.
Seria desonesto citar os
recentes casos da Grécia ou mesmo da Itália como exemplos de fracasso do
parlamentarismo. Nos dois países os chefes do executivo foram substituídos por
quem não tinha um voto popular sequer. Os gregos por pouco não apelaram para os
classificados para encontrar quem se dispusesse a gerir as dívidas ciclópicas
daquele país.
Há também o problema da divisão
de poderes naquele sistema. Como não existe uma linha divisória clara, o
executivo é sempre refém do legislativo. Isso também acontece em países
presidencialistas como o Brasil. Mas aqui seria de fácil solução caso fosse
adotado o voto vinculante nas eleições gerais.
Outra anomalia do
parlamentarismo reside na figura do presidente ou do monarca. Em Portugal, por
exemplo, o presidente tem poder para não aceitar o governo formado pelo
vencedor do pleito legislativo e convidar outro partido para tal. Com uma
canetada o voto popular majoritário vira lixo. O mesmo poderia acontecer na
Inglaterra monárquica. Dizer que a rainha reina mas não governa não expõe toda
a verdade. Os monarcas ingleses têm poder semelhante ao do presidente
português. Se em seu longo reinado Elizabeth II não se meteu na seara
parlamentar foi por puro bom senso. Mas se existe alguém sem bom senso, este é
o sucessor ao trono inglês. Charles já provou isso. Alem do mais é homem e os
varões são dotados da mais infantil das vaidades: mandar.
Não há vício no presidencialismo
que não se veja também no parlamentarismo. Outro dia Cavaco Silva com sua
proverbial falta de senso de oportunidade e inconfundível burrice, veio
queixar-se, diante das câmeras, que seus proventos não chegavam para pagar as
contas. Pelo que entendi da reportagem da televisão portuguesa, conseguiu mais
uns 2.900 euros depois da choradeira. Mas aí os jornalistas ficaram intrigados.
Quanto ganha o presidente português? A resposta ninguém sabe ao certo.
Especulou-se daqui e dali mas ninguém na República Portuguesa sabe. Só Sua
Excelência. Mas como uma coisa puxa outra, fiquei sabendo que cada
ex-presidente luso custa ao erário 300 mil euros anuais. A casa real espanhola
também não sai barata. Qualquer evento promovido pela família, seja casamento,
batizado ou chá de panela, é pago pelos súditos que vão contentes assistir,
detrás do cordão de isolamento, a entrada e saída dos convidados reais. Sendo
uma família, os espanhóis ainda têm que bancar cunhados e genros. Mas como
alguns genros não gostam de viver as custas dos sogros, o marido da Infanta Cristina
resolveu abrir seu próprio negócio de tráfico de influências apropriação de
fundos públicos e lavagem de dinheiro.
No Brasil uma das maiores fontes
de corrupção reside no próprio sistema político. O presidencialismo de alianças
que temos, põe o executivo na incômoda situação (para uns) de ter que negociar,
seja no atacado ou no varejo, com o que há de mais fisiológico na vida política
do país. Mas, como já disse, isto se resolveria em grande parte com a instituição
do voto vinculante. Se o eleitor fosse obrigado a votar num mesmo partido para
todos os cargos, ao assumir o poder, o presidente já contaria com maioria nas
duas casas legislativas. Para aperfeiçoar o sistema e dar ao povo o direito a
um voto de censura, bastaria que os mandatos dos deputados não coincidissem e a
cada dois anos se renovaria uma parcela da câmara baixa. Reduzindo o mandato de
senadores para 6 anos, uma das eleições para o senado coincidiria com a metade
do mandato presidencial, dando também ao eleitor o poder do voto censório.
Agora, vai convencer o PMDB.
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