sexta-feira, 13 de maio de 2016

Bateram nossa carteira





            Os códigos legais punem com mais rigor o roubo que o furto. Me parece lógico, afinal num roubo, num assalto a mão armada, por exemplo, há sempre o risco de morte da vítima. Num furto tal risco. a princípio, é menor ou inexiste. No roubo há a violência, física ou psicológica. No furto só frustração e vergonha.
            Talvez a única coisa que seja menos cruel no roubo, no assalto a mão armada, é que o que rouba tem uma face, um rosto para que odiemos. Se somos furtados ao percebermos a perda do valor, do objeto, algum tempo já se passou e sentimos raiva de nós mesmos, de nosso descuido, de nossa pouca percepção do perigo. É possível que um arrepio nos percorra a espinha ao pensarmos que poderíamos ter-nos dado conta do furto e reagido pelo susto sem saber qual seria a reação do ladrão ao ser flagrado.
            Socialmente, o fato de termos sido roubados nos trás simpatias, solidariedade e até empatia quando contamos o acontecido. No relato podemos acrescentar um ar de facínora ao assaltante, nossa calma diante da arma apontada, nosso desejo de encontrá-lo a sós e desarmado. Geralmente nos saímos bem quando narramos. Mas se contamos de uma carteira batida, de um casaco sumido quase que diante de nossos olhos, já não encontramos solidariedade dos que nos ouvem, mas sim reproches e reprimendas. Dirão que sempre fomos assim: uns descuidados. O furto nos envergonha, nos diminui. No assalto somos uma vítima da violência urbana, dos tempos que vivemos, da impunidade que campeia. Se furtados, somos tolos.
            O golpe que tirou a Presidenta Dilma de seu cargo mais se assemelha a um furto que a um roubo. Não nos mostraram a arma que nos tiraria a vida se reagíssemos. Não nos ameaçaram. Não há um rosto único e inconfundível para odiarmos. Tal qual o furto que ocorre dentro do ônibus lotado ou na calçada apinhada, tentamos nos recordar de alguma fisionomia da qual deveríamos ter suspeitado e não a achamos. Quem sabe se o golpe fosse dado ao velho estilo da quartelada, com tanques nas ruas e congresso fechado, sentiríamos menos vergonha.

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