Há pouco tempo atrás, eu assisti
uma reportagem que falava de leis estaduais que haviam sido consideradas
inconstitucionais pelo Supremo. Não me lembro de todos os números mas os que
guardei na memória são bem eloqüentes. De sete leis aprovadas pela Assembléia
Legislativa do Rio, seis foram barradas pelo STF. No caso de Santa Catarina a
decretação de inconstitucionalidade dos diplomas legislativos estaduais foi de
100%. Seis leis aprovadas na assembléia estadual, seis leis consideradas nulas
por afrontar a Constituição Federal. Aqui estamos falando apenas das leis cuja
constitucionalidade foi contestada junto ao Supremo. Muitas outras vigoram em
total desacordo com a Carta Magna sem que sua legitimidade seja argüida.
Ora, a principal atribuição dos
legisladores é legislar. Criar um ordenamento para a sociedade. Para exercer
esse labor contam com assessoria jurídica que lhes é oferecida pelas casas
legislativas além de poderem contratar, com verba de gabinete, outros
auxiliares. Ainda assim, nossos legisladores conseguem confeccionar verdadeiros
monstrengos jurídicos.
No âmbito municipal chega-se às
raias do absurdo. É que temos visto nas leis que tornam obrigatória a reza ou
leitura de trechos bíblicos nas escolas. Há um grande número dessas leis
vigorando em várias cidades brasileiras. Embora facilmente refutáveis quanto à
sua constitucionalidade, essas leis; enquanto vigoram, jogam o mundo escolar
numa polêmica que deveria estar restrita aos templos e à casa de cada aluno.
Abundam notícias de discriminação de estudantes, de disputas e até de assédio
moral àqueles que se recusam a participar da encenação religiosa.
Os autores dessas leis são,
quase que em sua totalidade, legisladores adeptos de seitas pentecostais ou
neo-pentecostais. Muitos deles também pastores de suas seitas. A rejeição da
sociedade ou a ação do ministério público que tenta impedir a validade de tais
éditos, não são entraves para que a cada tanto outra lei do mesmo teor seja
votada e aprovada por Câmaras Municipais.
Se o fanatismo religioso dos
evangélicos explica esse tipo de ação nas Câmaras Municipais, no Congresso
Nacional a bancada evangélica tende a ser mais prática. É o que indica a
proposta de lei do Deputado Eduardo Valverde (falecido ano passado) que propõe
subsídio de energia elétrica para templos religiosos. O relator da matéria é o
Deputado Antônio Bulhões ligado à Igreja Universal. O projeto de lei já passou
pela Comissão de Constituição e Justiça e foi aprovado por esta. Tramita com
celeridade e agora será encaminhado para outras comissões da casa.
Outro projeto que tenta ir
diretamente ao bolso do trabalhador brasileiro sem passar pela oferta nem pelo
dízimo, é de autoria do Deputado Aguinaldo Ribeiro e propõe que os recursos do
fundo de garantia possam ser usados para a construção de templos.
Assim como essas duas aberrações
que querem virar leis, outra iniciativa da bancada crente tenta modificar
profundamente a constituição dando ao Congresso um papel de revisor das
decisões do Supremo Tribunal Federal. Isso, claro, tem a ver com as posições
tomadas pela corte suprema com relação à união estável de pessoas do mesmo
sexo, a garantia da legalidade da marcha da maconha e a autorização para o
aborto de anencéfalos.
Com a vaselina de Crivela e os
coices de Magno Malta, os evangélicos vão avançando na descaracterização do
estado laico e na imposição de suas crenças medievais. Conseguem trazer para
discussão temas já soterrados pelo ordenamento jurídico ou pela prática social.
No último censo demográfico
ficou patente o crescimento das seitas pentecostais no Brasil. Na verdade, não
houve crescimento e sim explosão. Há quem já preveja para um futuro nem tão
distante a mudança de religião hegemônica no país. Fato raro no mundo moderno.
Não há maneira de evitar o
avanço dos que prometem curas, milagres e prosperidade já. Os políticos no
intuito de angariar votos entre os pentecostais e neo-pentecostais, de tudo
fazem para agradá-los.
Quando era prefeito de Curitiba, Beto Richa sancionou
lei que incluiu a marcha para Jesus no calendário oficial de eventos do
município. Como governador do Paraná tornou o dia da marcha, evento estadual.
Aqui, Richa entra apenas como exemplo pois por toda parte se dá o mesmo.
Alkimim foi à inauguração do templo de Waldemiro em São Paulo e orou com
toda a família. O homem da Opus Dei não se acanhou.
No Rio a lei que torna
obrigatório o ensino religioso vem nessa mesma toada: agradar a crentalhada que
é quem mais pugna por encher de palavrório místico a cabeça dos meninos antes
que eles comecem a pensar.
Mas o mais grave abuso da lei,
pois a desrespeita, está na compra e venda de horários nas TVs para
proselitismo religioso. A Presidência da República parece que já se mobiliza
para pôr freios ao descumprimento das normas que regem o serviço de radiodifusão
por parte das concessionárias. Imagino que a matéria seja discutida depois das
eleições, pelo congresso. Antes do pleito municipal, nem pensar.
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