terça-feira, 3 de julho de 2012

Crente que legisla.







Há pouco tempo atrás, eu assisti uma reportagem que falava de leis estaduais que haviam sido consideradas inconstitucionais pelo Supremo. Não me lembro de todos os números mas os que guardei na memória são bem eloqüentes. De sete leis aprovadas pela Assembléia Legislativa do Rio, seis foram barradas pelo STF. No caso de Santa Catarina a decretação de inconstitucionalidade dos diplomas legislativos estaduais foi de 100%. Seis leis aprovadas na assembléia estadual, seis leis consideradas nulas por afrontar a Constituição Federal. Aqui estamos falando apenas das leis cuja constitucionalidade foi contestada junto ao Supremo. Muitas outras vigoram em total desacordo com a Carta Magna sem que sua legitimidade seja argüida.
Ora, a principal atribuição dos legisladores é legislar. Criar um ordenamento para a sociedade. Para exercer esse labor contam com assessoria jurídica que lhes é oferecida pelas casas legislativas além de poderem contratar, com verba de gabinete, outros auxiliares. Ainda assim, nossos legisladores conseguem confeccionar verdadeiros monstrengos jurídicos.
No âmbito municipal chega-se às raias do absurdo. É que temos visto nas leis que tornam obrigatória a reza ou leitura de trechos bíblicos nas escolas. Há um grande número dessas leis vigorando em várias cidades brasileiras. Embora facilmente refutáveis quanto à sua constitucionalidade, essas leis; enquanto vigoram, jogam o mundo escolar numa polêmica que deveria estar restrita aos templos e à casa de cada aluno. Abundam notícias de discriminação de estudantes, de disputas e até de assédio moral àqueles que se recusam a participar da encenação religiosa.
Os autores dessas leis são, quase que em sua totalidade, legisladores adeptos de seitas pentecostais ou neo-pentecostais. Muitos deles também pastores de suas seitas. A rejeição da sociedade ou a ação do ministério público que tenta impedir a validade de tais éditos, não são entraves para que a cada tanto outra lei do mesmo teor seja votada e aprovada por Câmaras Municipais.
Se o fanatismo religioso dos evangélicos explica esse tipo de ação nas Câmaras Municipais, no Congresso Nacional a bancada evangélica tende a ser mais prática. É o que indica a proposta de lei do Deputado Eduardo Valverde (falecido ano passado) que propõe subsídio de energia elétrica para templos religiosos. O relator da matéria é o Deputado Antônio Bulhões ligado à Igreja Universal. O projeto de lei já passou pela Comissão de Constituição e Justiça e foi aprovado por esta. Tramita com celeridade e agora será encaminhado para outras comissões da casa.
Outro projeto que tenta ir diretamente ao bolso do trabalhador brasileiro sem passar pela oferta nem pelo dízimo, é de autoria do Deputado Aguinaldo Ribeiro e propõe que os recursos do fundo de garantia possam ser usados para a construção de templos.
Assim como essas duas aberrações que querem virar leis, outra iniciativa da bancada crente tenta modificar profundamente a constituição dando ao Congresso um papel de revisor das decisões do Supremo Tribunal Federal. Isso, claro, tem a ver com as posições tomadas pela corte suprema com relação à união estável de pessoas do mesmo sexo, a garantia da legalidade da marcha da maconha e a autorização para o aborto de anencéfalos.
Com a vaselina de Crivela e os coices de Magno Malta, os evangélicos vão avançando na descaracterização do estado laico e na imposição de suas crenças medievais. Conseguem trazer para discussão temas já soterrados pelo ordenamento jurídico ou pela prática social.
No último censo demográfico ficou patente o crescimento das seitas pentecostais no Brasil. Na verdade, não houve crescimento e sim explosão. Há quem já preveja para um futuro nem tão distante a mudança de religião hegemônica no país. Fato raro no mundo moderno.
Não há maneira de evitar o avanço dos que prometem curas, milagres e prosperidade já. Os políticos no intuito de angariar votos entre os pentecostais e neo-pentecostais, de tudo fazem para agradá-los. 
Quando era prefeito de Curitiba, Beto Richa sancionou lei que incluiu a marcha para Jesus no calendário oficial de eventos do município. Como governador do Paraná tornou o dia da marcha, evento estadual. Aqui, Richa entra apenas como exemplo pois por toda parte se dá o mesmo. Alkimim foi à inauguração do templo de Waldemiro em São Paulo e orou com toda a família. O homem da Opus Dei não se acanhou.
No Rio a lei que torna obrigatório o ensino religioso vem nessa mesma toada: agradar a crentalhada que é quem mais pugna por encher de palavrório místico a cabeça dos meninos antes que eles comecem a pensar.
Mas o mais grave abuso da lei, pois a desrespeita, está na compra e venda de horários nas TVs para proselitismo religioso. A Presidência da República parece que já se mobiliza para pôr freios ao descumprimento das normas que regem o serviço de radiodifusão por parte das concessionárias. Imagino que a matéria seja discutida depois das eleições, pelo congresso. Antes do pleito municipal, nem pensar.


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