Essa semana, em meio ao julgamento da ação penal 470,
tivemos a eleição do Ministro Joaquim Barbosa para presidência da mais alta
corte do país. Cumpriu-se o rito com a elegância de sempre. Joaquim Barbosa foi
eleito por 9 votos contra 1. Para muitos foi apenas uma formalidade já que nome
e placar da votação eram sabidos de antemão. Mas enganam-se.
A eleição de Joaquim Barbosa está repleta de simbolismo e
sua formalização tem valor igual ou maior que o selo do Imperador em carta de
alforria. Sim, pois é um homem negro que vai ocupar a cadeira de Presidente do
Supremo Tribunal Federal. Um homem
negro, e é preciso que assim se diga. Não um afro-descendente ou qualquer outro
eufemismo. Um homem negro. Um
descendente daqueles que aqui aportaram tendo grilhões a sujeitar-lhes braços e
pernas e que produziram, sem embargo, um milagre cultural nessas terras.
Assim como Rebouças e Milton Santos, Joaquim Barbosa atinge
o ponto mais alto de sua carreira por sua alta capacidade, seu intelecto
privilegiado. Mas isso nem sempre é suficiente quando se trata de uma pessoa
negra. Há que matar um leão por dia para, simplesmente, afirmar sua humanidade.
Pois bem, todos os sacrifícios foram feitos, todas as lutas
travadas e hoje temos um homem negro eleito por seus pares para presidir um dos
três poderes da Nação. Depois de todas as injustiças sofridas pelos negros em
nosso país, um homem negro presidirá a casa guardiã da constituição que reza em
seu artigo 5º: “Todos são iguais perante a lei”. Infelizmente não perante a
sociedade, daí a importância da eleição de Barbosa, um homem negro.
Talvez você, meu amigo, queira contestar essa minha
insistência quanto à cor da pele do Ministro, recém eleito presidente do STF, opondo
o valor maior do currículo de Joaquim Barbosa, sua trajetória brilhante desde a
pequena Paracatu até a corte suprema, seu doutorado na Sorbonne ou mesmo o
sistema de rodízio dos ministros do Supremo no comando do tribunal. Ora, meu
caro, não sejamos hipócritas. Nesse país, que teima em maltratar seus filhos
negros, a assunção de Barbosa à cadeira maior da maior das cortes, é um rasgo
na história, uma afirmação.
Tentar omitir a cor de Joaquim Barbosa, em nome da
democracia racial, ou seja lá por que motivo, é o mesmo que tentar usar sua
escolha para presidir a corte, como argumento contra as cotas raciais nas
universidades. E, pode ter certeza, isso será feito. A vitória desse homem negro, do povo negro,
será usada contra ele.
A luta empedernida contra as cotas raciais nas universidades
públicas, que teve até mesmo um partido político como autor de uma ação de
inconstitucionalidade, nos deu mostra de como nossa sociedade ainda deseja os
privilégios de cor, de raça, de classe.
A cobertura jornalística da eleição de Joaquim Barbosa
padeceu, como era de se esperar, de profundidade. Pouco ou nada se falou de sua
importância simbólica. Se não se fala na cor do Ministro, não se faz necessário
falar do racismo, esse tema incômodo. Mas há muito que já não espero nada de
nossa imprensa nem de nossas elites. Tampouco de nossa classe média que vê os
que ascendem socialmente como uma ameaça aos seus mesquinhos privilégios
Eu prefiro guardar na memória que no dia 11 de outubro de
2012 foi eleito para presidir o Supremo Tribunal Federal, um homem negro.
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