sábado, 22 de dezembro de 2012

Tiro no pé


                Quem acompanhou a eleição presidencial de 1989, deve se lembrar, pelo menos, de dois fatos: a edição feita pela Globo do último debate entre Lula e Collor, que favorecia o então candidato dos Marinho e a aparição, no programa eleitoral de Collor, da ex-mulher de Lula.
                Hoje tenho minhas dúvidas quanto ao impacto da edição do debate nos números finais daquela eleição. Havia muita expectativa em torno do pleito, afinal se elegeria diretamente um presidente depois de 27 anos. A forte polarização não fazia crer em um número muito elevado de indecisos naquela altura do campeonato.  Que alguém mudasse de opinião, motivado apenas pelas imagens editadas, me parece improvável.
                O outro fato pode ter sido mais relevante para a vitória de Collor. Numa sociedade conservadora como a nossa, a presença da ex-companheira de Lula afirmando que este queria forçá-la a fazer aborto quando engravidara de Luriam, provocou muita comoção. Até hoje o  aborto é tabu entre os religiosos do país. Além do mais, ficou no imaginário popular a figura de um homem forçando uma mulher a fazer algo contra sua vontade. O forte contra o fraco.
                Depois de prestar esse serviço a Collor, a pobre mulher foi para a Europa e nunca mais se ouviu falar dela.
                A utilização de um fato pretérito da vida pessoal do candidato adversário como recurso para desqualificá-lo, inaugurou, naquela eleição, uma maneira de fazer campanha política com a qual já nos acostumamos depois de todos esses anos de esculacho e esculhambação. Mas sempre há do que espantar-se.
                No facebook apareceu uma tirinha grosseira, que tentava ser humorística, citando que Fernando Henrique Cardoso tem 2 filhos fora do casamento. A notícia é velha. De um dos filhos já se falava desde 2009, do outro desde 2011.
                Assim como Collor em 89, alguns petistas de hoje tentam atacar um adversário político levantando questões de sua vida privada. O que se deve cobrar de FHC e de seu inoperante governo, são as privatizações escandalosas, a estagnação econômica do país durante os 8 anos de sua estada no poder. Dele, deve ser questionado o modo como conseguiu sua reeleição, as alianças espúrias que fez, sua adesão às teses neoliberais.  Sua vida íntima não deveria interessar a ninguém ou, pelo menos, que só se falasse disso nas colunas de fofocas e futilidades. Não é tema político. Ademais, Fernando Henrique Cardoso nunca posou de moralista.
                Mas por que vêm os petistas requentar o assunto dos filhos naturais do ex-presidente nas redes sociais? Qual o motivo do vezo udenista?
                Bem, em primeiro lugar, porque os petistas vêem FHC como o principal adversário de Lula, já que nem Serra, o vampiro da paulicéia, nem Alkimim, o picolé de chuchu, foram páreo para o ex-metalúrgico. Fernando Henrique foi quem derrotou Lula em duas eleições e é também quem mais ataca Lula sempre que a oportunidade aparece.
                Em segundo lugar, porque Lula vem sendo alvo de denúncias feitas por Marcus Valério, que tenta involucrar o ex-presidente no escândalo do mensalão. O publicitário dos milhões entregou ao Procurador Geral da República documentos que provariam a participação de Lula no caso. Entre esses documentos, (poucos, segundo as palavras de Gurgel) estariam dois recibos de depósitos bancários. Os petistas tentam, através do factóide, desviar as atenções. O estratagema é pueril e inepto. Coisa de aloprados.
               Não creio que Lula esteja envolvido em corrupção. Pelo menos não o vejo como um recebedor de propinas. Tampouco creio no seu desconhecimento dos fatos relacionados com o mensalão. Crer nisso seria fazer pouco caso da inteligência, da argúcia de Lula. Mas para quem acha que José Dirceu é inocente, Lula deve parecer um santo.
                Outra postagem que tenta ganhar vida nas redes sociais, e também está relacionada às denúncias de Marcus Valério tem os seguintes dizeres: “Mexeu com Lula, mexeu comigo”. Parece-me outra idéia aloprada. O que querem esses amigos de Lula compartindo visão tão acrítica do ex-presidente?
                Durante seu governo, Lula acertou mais que errou. A estabilidade econômica e os programas sociais retiraram da pobreza extrema milhões de brasileiros. A política externa, praticada durante seu mandato, foi conseqüente e altiva. E também em outras áreas houve avanços importantes. Isso não quer dizer que em outros temas seu governo não tenha fracassado rotundamente.
                Fica no passivo de Lula, a acomodação de companheiros em infinitos cargos comissionados, desprestigiando os funcionários de carreira, a falta de uma ação mais decisiva do governo federal para amenizar o drama da saúde pública, uma política de educação que merecesse esse nome e maiores passos na questão da reforma agrária. Principalmente nessas  áreas, faltou ação e sobrou discurso.  
                Quanto às denúncias, cabe respondê-las. Não basta chamar Marcus Valério de vagabundo, como fez Lula recentemente. Foi esse vagabundo que, com seu esquema, ajudou o PT e o governo a desviar verbas públicas para os bolsos de deputados corruptos e cofres de partidos de aluguel. Graças ao esquema de Valério, o governo conseguiu aprovar no Congresso, projetos impopulares, como a reforma da previdência.
                As denúncias de Valério podem ser apenas uma tentativa desesperada de conseguir uma redução de sua pena de mais de 40 anos. Ou a frustração de quem se viu abandonado, sem o respaldo daqueles que, ainda tendo fatias de poder, poderiam ajudá-lo.
                O fato é que ao tentar desqualificar Valério, chamando-o de vagabundo e delinqüente, os petistas assumem toda a maracutaia que insistiam em negar, pois se Valério delinqüiu, não o fez sozinho nem por conta própria. Tiro no pé.




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