quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Amélia



Outro dia, li que alguém (não me pergunte quem, pois já esqueci o nome) gravou uma música muito tola e machista. Parece que esse alguém tem algum prestígio, tanto que sua suposta tolice repercutiu nas redes sociais com gente acusando e gente defendendo o autor da “obra”.
Entre os que polemizavam surgiu o exemplo de “Amélia”. Fez-se a comparação entre a música em questão com a obra imortal de Ataulfo Alves e Mário Lago. Nesse ponto todos concordavam que Amélia era um símbolo de composição machista, ainda que uns dissessem que não se podia comparar o nível de consciência de hoje com o do tempo de Ataulfo. Nesse caso, e em muitos outros, esquece-se que o cantor ou compositor não é o letrista e, para o bem e para o mal, Ataulfo leva as críticas que deveriam ser dirigidas a Mário Lago, o autor da letra.
 Eu escuto “Amélia” desde criança e na idade adulta, quando entrei em contato com as questões de gênero, sempre ouvi e li que esta composição era machista. O problema é que não encontro o tal machismo na letra da música. Talvez você possa me ajudar afinal, se todos vêem machismo na letra e eu não, o errado devo ser eu. Aí vão os versos:

“Nunca vi fazer tanta exigência
Nem fazer o que você me faz
Você não sabe o que é consciência
Não vê que eu sou um pobre rapaz”

Até aqui não consegui ver machismo algum. São queixas de amor que  poderiam vir na voz feminina. Talvez na segunda estrofe...

“Você só pensa em luxo e riqueza
Tudo o que vê, você quer
Ai meu Deus que saudade da Amélia
Aquilo sim é que era mulher”

Nesses dias interessantes em que vivemos, quando “Sex and the city” é tida como uma série feminista e comprar muitos pares de sapatos, um ato libertário, esses versos devem mesmo incomodar. Mas ainda assim eu não vejo sequer um lampejo de machismo. Sigamos:

“As vezes passava fome ao meu lado
E achava bonito não ter o que comer
E quando me via contrariado dizia
Meu filho o que se há de fazer”

Aqui encontramos uma Amélia romântica, conformada com a pobreza ou estóica, mas nem de longe me parece uma vítima do machismo. E conclui Mário Lago num saudoso elogio à Amélia:

“Amélia não tinha a menor vaidade
Amélia é que era mulher de verdade”

Bem, eu sou do tempo em que as feministas também se recusavam a adotar vaidades fabricadas pelo mercado da beleza e outras que tais.  Amélia me parece mais com uma mulher dos anos 70 do que a mulher submissa, como querem pintá-la.
Se você puder apontar onde está o machismo nessa letra, por favor, não deixe de escreve-me.


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