sábado, 26 de março de 2016

Sérgio Moro





            Nelson Rodrigues era, segundo ele mesmo dizia, uma flor de obsessão. Suas frases, seus personagens e arquétipos nos ficaram na memória pela genialidade do criador e por terem sido repetidas e reapresentados por ele obsessivamente. . Era como se ele quisesse que seus ditos, suas criações nos entrassem adentro e, em diversas doses, nos inoculava com essa vacina contra o esquecimento.
            Lembro de ter lido não sei quantas vezes em suas crônicas esportivas que "no futebol o pior cego é o que só vê a bola". Claro que Nelson não estava se referindo aos esquemas táticos, às variantes do jogo, às estratégias mirabolantes dos técnicos e outras baboseiras com as quais os comentaristas de hoje nos torram a paciência com seu pretenso conhecimento.Não, Nelson estava interessado em nos mostrar outra coisa. Dizia, complementando a frase, que mais importante que a bola é o homem que corre atrás dela. O importante, na visão de Nelson, era o ser humano.Eu penso o mesmo. Não creio que nenhum tsunami, nenhuma pororoca nem mesmo o dilúvio universal sejam mais importantes que o ser humano. Não que eu acredite que nossa espécie seja grande coisa, mas é o que deveria nos interessar antes de tudo. Mesmo na sua mesquinhez, na sua vileza , na sua abjeção o ser humano deveria ser o centro de nossas preocupações e cuidados.
            Esses dias interessantes que vivemos estão repletos de seres humanos que bem poderiam ser personagens rodrigueanos. São todos pachecos, tuninhos e zózimos em pequenez, em sordidez, em nanismo mental. Poucas épocas viram tantos canalhas e pulhas em flor. Mas em nosso afã de entender conjunturas, processos e articulações políticas deixamos de nos embriagar com a riqueza desses personagens mesquinhos e medíocres que nos cercam.
            Veja o caso do juiz Moro. Ou melhor, vejam o caso do Sérgio Moro, o rapaz do interior do Brasil que cursou direito, foi aprovado na prova da OAB, fez concurso para a magistratura e agora tem em suas mãos um dos mais rumorosos casos de corrupção do país. Note que não é o juiz e sim Sérgio que repentinamente é o foco das atenções. Não é a toga, é a gravata. Não é o saber jurídico, é a pose. Metade do Brasil está fascinada pela gravata e pela pose. A outra metade execra o figurino completo. Sérgio tem um exército de fãs como se fosse um galã de novela ou um cantor sertanejo e tantos inimigos quanto um juiz de futebol.  Existe um suspense de Odete Reutmann em torno de Sérgio Moro. Qual será seu próximo passo é a pergunta que todos nos fazemos. Do gari ao ex-presidente; do dono de grandes fortunas ao empregado de balcão.Há uma nação pendente de Sérgio Moro.
            E o que faz Sérgio Moro diante de tão aguda expectativa? Deslumbra-se. Na festa de lançamento de uma candidatura abaixo da crítica, deslumbra-se. Cercado de jornalistas internacionais, deslumbra-se. Paparicado por políticos de alto coturno a quem deveria estar investigando, deslumbra-se. Numa entrega de prêmios ao lado de figuras da TV, deslumbra-se e sorri como um menino feliz por ter conhecido a Dysneylândia. Poderia estar pensando nos mais altos postos da magistratura que certamente estariam a sua disposição caso se desincumbisse da enorme tarefa com denodo, mas não. Sérgio Moro prefere a fama e as capas das revistas de má reputação. Os tapinhas nas costas dos bajuladores e os elogios fáceis dos que elogiam por encomenda. Sérgio Moro é um ser humano pequeno a quem as circunstâncias deram um papel demasiado grande. Sérgio Moro é um Pacheco. Um pequeno Pacheco sem remissão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário