Já ouvi muita gente dizer:_”Eu
adoro chuchu com camarão”. Depois faz humm e revira uzoim. A frase e o teatral
acompanhamento têm o selo da falsidade. Ninguém adora chuchu com camarão.
Sequer gosta de chuchu com camarão. As pessoas gostam é de camarão.
O crustáceo é consumido puro, ao
alho e óleo, frito, empanado, no espetinho, na moranga. Já o chuchu, só
refogado na necessidade. Mas o camarão custa, como sempre custou, os olhos da
cara enquanto o chuchu é barato. O camarão é fruto do mar oceano, o chuchu
fruto de quintal. Não existe latifúndio de chuchu nem o BNDES tem linha de
crédito especial para seu plantio. O camarão viaja de navio e até de avião pelo
mundo. O chuchu, de caminhão Chevrolet da lavoura pra feira. Em toda parte
camarão é iguaria. Chuchu, o quarto estado da água.
Imagino que a insólita
combinação tenha origem num tempo em que a pobreza era menos envergonhada de
ser pobre e uma mãe caiçara ou manezinha
podia dizer à sua prole:_Hoje só tem chuchu... mas é com camarão. Depois
da decepção, o sorriso da meninada. Mas os tempos são outros e a fórmula de
alegrar meninos pobres foi incorporada pela classe média.
Apoio minha teoria do berço
humilde da receita no fato do chuchu preceder o camarão no enunciado, diferente
de outras fórmulas que colocam em destaque o que veio das redes deixando em
segundo plano o que chegou no caixote.
Na enganadora receita, o chuchu
entra como Pilatos no Credo. Faz figuração, enche o palco. Sua função culinária
é fazer aquela bandeijinha de 600 gramas de camarão, sem descontar o gelo,
virar uma refeição para a família e convidados. Servido com um volumoso
acompanhamento de arroz e molho encorpado, o blefe gastronômico ainda ilude
muitos incautos. Estes, além dos falsos e dos sugestionáveis, são os que dizem,
revirando uzoim:_”Adoro chuchu com camarão, humm!”
Mas, verdade seja dita, o chuchu
já salvou muita dona de casa que, envergonhada de servir uma honesta sardinha
frita, apelou para a planta humilde e adornou seu cardápio.
O chuchu também tem contribuído
para a prosperidade de doceiros e afins, mas estes não fazem como a ruborizada
dona de casa ou o empertigado “chef” que anunciam o conluio de seus
ingredientes. Não. Doceiros e afins (seja lá o que possa ser entendido como
afins) escamoteiam suas receitas e não estampam em seus potes e latas a
colaboração indispensável do chuchu. Jamais vimos num rótulo seu nome ao lado
de frutos mais nobres. Nunca um doceiro fez reclame de geléia de goiaba e
chuchu ou doce de chuchu com marmelo. Muito menos os afins.
À sombra da modesta trepadeira
floresceram indústrias, banquetes foram servidos e muita gente tirou o pé da
lama mercadejando manjares que só puderam chegar à boca do pobre graças ao
chuchu. Mas a verdade é uma só e deve ser proclamada: Ninguém gosta de chuchu.
Como sempre, tudo escrito pelo senhor JG, e impecavel, praseiroso de ler e instrutivo. Nao sei o que o resto de seus assiduos leitores pensarao e eu nunca gostei de ser excepcao. Mas eu ADORO chuchu, desde da palavra doblesilabica ao gosto refrigerante. Adoro, mas faz decadas que nao como... Mas nao e por isso
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