sexta-feira, 27 de março de 2015

Demagogia papal



As palavras vão ganhando novos significados com o passar do tempo. Demagogia, por exemplo, passou a significar qualquer coisa que um governante faz em favor do povo pobre. Seu sinônimo agora é populismo. Cotas raciais, renda mínima, inserção social; tudo isso é denominado como demagogia pelos engravatados que freqüentam os estúdios das TVs, os comentadores do facebook e os editorialistas dos jornais.
Eu já sou velho para essas novas interpretações e por isso chamo de demagogia o que meu velho dicionário diz que é demagogia.
Faz pouco tempo, Sua Santidade, o Papa Francisco, doou para os sem teto de Roma umas centenas de guarda-chuvas que haviam sido esquecidos por visitantes do Vaticano. Não usou do dinheiro que tem o Banco do Vaticano para construir casas ou abrigos para os que vivem ao relento, não fez sequer campanha para arrecadação de fundos exortando os católicos milionários para que doassem para tal fim. Não, o Papa deu-lhes guarda-chuvas.
Umas semanas depois, o Sumo Pontífice fez que enterrassem um mendigo nas proximidades das sepulturas de cardeais e outros potentados da hierarquia romana e pediu que as dioceses fizessem o mesmo. Não falou em dar vida digna aos que mendigam, não criou restaurantes populares, não mandou construir hospitais que lhes prolongasse a vida. Mandou-os enterrar junto aos que sempre viveram bem.
Para culminar foi anunciado que o Vaticano irá proporcionar visitas “VIP” à Capela Sistina para os moradores de rua. Chuveiros já foram instalados para o banho dos visitantes que entrarão por onde entram os funcionários e prelados e farão a visita quando não haja outros visitantes pagantes nos museus e outras instalações. Isso acontecerá quinta-feira à tarde. Os cerca de 150 moradores de rua que freqüentam a área do Vaticano terão o privilégio de apreciar os afrescos de Michelangelo e outros tesouros que a Santa Sé colecionou durante os séculos. Imagino que um lanchinho seja providenciado para que ninguém desmaie de fome durante o longo périplo.
Tão evidente demagogia me fez lembrar das visitas que o primo pobre fazia ao primo rico no humorístico “Balança mas não cai” que eu via quando era criança. Ainda posso ver a cara de frustração que Brandão Filho, que interpretava o primo pobre, fazia ao final dessas visitas. Acabei rindo do que era para chorar.

A agência Reuters, de onde colhi a notícia, não vê nenhuma graça nem demagogia no assunto e termina sua nota dizendo que Francisco era conhecido em sua Buenos Aires natal como o bispo das favelas devido às freqüentes visitas que fazia às comunidades carentes da capital argentina. Segundo a Reuters o Papa Francisco “fez da preocupação com os pobres uma das principais preocupações do seu papado.” Tô vendo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário