Você sabe, eu tenho cá meus problemas com o vernáculo. Não
pense que meus erros são fruto de incúria ou desleixo. Não, eu tento caprichar.
Principalmente quando penso que você, minha amiga, pode estar lendo meus
escritos, não posso menos que tentar caprichar.
Mas não é o que faz todo mundo que bota seus pensamentos em letra de imprensa. Existe hoje quase que um
desprezo pelas regras mais primárias do idioma. E aqui não me refiro só aos
comentaristas do facebook e dos sítios informativos. Falo de gente que vive do
ofício de pôr tintas no papel. O fato é que nunca na história desse país se
escreveu tão mal. E fala-se pior ainda.
O Brasil bem que mereceu um Prêmio Nobel de Literatura com
Guimarães Rosa, Drummond ou João Cabral. Hoje eu não sei se temos literatos
nesse mesmo patamar. É bem verdade que não leio os últimos lançamentos, os
novos escritores não me são familiares, mas intuo que a coisa anda mal nas
letras brasileiras.
Um dos motivos de minha desconfiança com relação a nossa
produção literária atual são os textos que escritores mandam para jornais,
revistas e sítios informativos da internet. Veja se não é o caso.
A escritora Márcia Denser já escreveu uma porrada de livros
e quando digo uma porrada, é uma porrada mesmo. Um de seus romances, A ponte das
estrelas, virou best seller e outro teve adaptação para o cinema. Confesso que
nunca os li. Nem esses nem nenhum outro da autora. Conheci Márcia Denser através
do sítio Congresso em foco, no qual ela assina uma coluna semanal.
Márcia Denser coleciona prêmios literários e contos
seus fazem parte de antologias importantes. Já foi traduzida em oito idiomas. É
Mestre em comunicação e semiótica pela PUC-SP e foi curadora de literatura da
Biblioteca Sérgio Milliet em São Paulo
Como cronista, ela
não faz meu tipo. Seu tom, geralmente agressivo, não me agrada. Lendo-a tenho
sempre a impressão de estar diante de algum relatório escrito por um burocrata
bêbado. Bêbado e desiludido.
Esta semana, em sua coluna no Congresso em foco, Márcia
Denser assina um texto cujo título “É a imprensa, estúpido”, diz muito de sua
forma de se comunicar com seus leitores. A escritora deve pensar que somos uns
masoquistas patológicos e nos ofende desde o título, pois lendo o artigo,
sabemos que o estúpido a quem ela se refere somos nós mesmos.
Mas isto seria apenas uma questão de forma, de estilo. O que
vem já no segundo parágrafo do artigo citado é o que quero comentar. Lá, Márcia
Denser nos manda a seguinte letra: “Na melhor das hipóteses, pode-se dizer que
houveram períodos...” Pois é, houveram. Escritora, jornalista mestre em
comunicação e semiótica, curadora de literatura e manda um “houveram”.
Dona Telma, lá nos anos 70, me ensinou que o verbo haver
significando existir, vai sempre no singular. Dona Telma não era escritora. Era
uma professora de português numa escola da periferia onde estudavam filhos de
operários, mas fora aluna de Magda Soares. Amava as letras e, penso, seus
alunos. Chegava de longe no seu fusquinha para nos deixar menos toscos.
Mas voltando à profissional das letras e seu texto.
Alguns parágrafos
adiante Márcia Denser nos brinda com mais essa: “a direita e os conservadores
passaram a fazer o que bem entendesse...” E aí, me peguei pensando: _Cadê a
concordância, estúpida? Apenas não o disse porque sou metido a educadinho.
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