terça-feira, 7 de maio de 2013

Doença ou adversário?



                Acontece. O sujeito anda por aí muito fagueiro e num exame qualquer lhe diagnosticam um câncer. Dependendo do tipo de câncer, da precocidade do diagnóstico e da situação econômica do cidadão, ele tem boas chances de cura. Foi o que aconteceu com a Presidenta Dilma e com o ex-presidente Lula, já o Comandante Chaves não teve a mesma sorte.
                Câncer não escolhe idade, classe social, etnia nem credo. Sua capacidade democrática de matar é o que o torna temível e terrível.
                Sem embargo, há entre os afetados pela doença um grupo especial: são os famosos.
                A cura de um cidadão comum pode ser atribuída à sua fé, ao milagre do santo, às preces da família. Pouco ou nada se fala da medicina, das pesquisas dos cientistas ou da perícia do médico. Mas o paciente será, assim como quem o tratou, ignorado. O sucesso do tratamento será atribuído ao divino, ao sobrenatural.
                Quando de famosos se trata, é diferente. Um famoso não se cura, ele vence o câncer. Se for um atleta, a “batalha travada” ganha tons épicos na voz dos narradores esportivos. O cara já não é um paciente, é um herói. Foi ele que venceu a doença jogando na casa do adversário, com torcida contra e na altitude. Médicos, drogas, tratamentos de ponta? Que nada, foi ele quem venceu o câncer a custa de muito treinamento e esforço pessoal. Assim foi com o Lance Armstrong.
                O ciclista teve um câncer nos testículos, se curou, ou melhor, derrotou o câncer com vários quilômetros de vantagem. Criou aquela pulseirinha para arrecadar verbas não sei pra quê, e ele, que já era herói, entrou para o rol dos semideuses. 
                Pouco tempo depois soube-se que Armstrong pedalava dopado. Foi punido, esperneou, voltou atrás e reconheceu o doping tentando diminuir a punição e poder voltar ao esporte. Os adoradores de ídolos ficaram com cara de tacho. Os narradores esportivos pararam de falar em superação, exemplo de vida e outras bobagens de ocasião quando se referiam ao atleta. Já era tarde para reconhecer que Armstrong era apenas um cara que teve câncer e se curou. Um cara que milita num esporte no qual os casos de doping são freqüentes.
                Mas rei morto, rei posto. Há que se criar um novo herói para ser exemplo para os pacientes anônimos do SUS do Meier e ensinar-lhes a vencer o câncer.
                Semana passada eu assistia a luta entre Floyd Maywheather e Robert Guerreiro. Antes da peleja, muito se falou da vida privada dos pugilistas. De Maywheather dizia-se que estivera em cana por dois meses por ter batido na mulher e de Guerreiro, que se afastara dos ringues por longo tempo para cuidar de sua mulher que estava com câncer.
                Atrás de espessa camada de reboco, cílios postiços e plumas de pavão, estava a Senhora Guerreiro que, sempre que era mostrada na tela, arrancava do narrador da luta frases como:_ Ela também é uma guerreira!
                Ao final do combate, vencido por grande margem de pontos por Mayweather, a TV já não mostrava mais a “guerreira”. É que para virar heroína e exemplo de vida na TV, não basta derrotar o câncer por knockout, o marido tem de vencer a luta. Aí sim é happy end.

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