No Governo Fernando Henrique Cardoso, criou-se um programa
de subsídio do gás de cozinha muito interessante. As famílias que consumiam pouca
energia elétrica levavam suas contas pagas até o correio e lá recebiam um vale
para trocar por botijões de gás. Além de prover os mais pobres com esse produto
de primeira necessidade, o programa ajudava a economizar energia elétrica.
Num dia daqueles tempos, eu fui aos correios postar uma
carta. Havia fila. Enquanto esperava, escutava as conversas das pessoas e assuntava.
Um senhor que estava na minha frente tinha em mãos uma grande quantidade de contas
de luz para serem trocadas por vales de gás. Julguei tratar-se de um desses
bons samaritanos que estaria prestando um serviço aos vizinhos de algum bairro
distante do centro da cidade, evitando assim que gastassem o dinheiro da
passagem de ônibus. Não era.
O senhor, que reconheci depois de alguns minutos, era um sujeito que possuía muitas
casas de veraneio próximas à praia. Como as casas não eram alugadas fora da
temporada turística, seu consumo de energia era baixo e seu proprietário tinha
então o “direito” de receber os vales para trocar pelo gás de cozinha.
Estava claro que o tal programa não estava dirigido àquele
tipo de público e sim às famílias que consumiam pouca energia elétrica por
viverem em casas pequenas e não possuírem muitos eletrodomésticos. Um quarto e
sala com 4 lâmpadas, geladeira, chuveiro elétrico, TV e liquidificador. O
programa se propunha a ajudar gente pobre.
Fiquei imaginando o que faria aquele cara-de-pau com tantos
botijões de gás. Na certa teria de revendê-los,
pois em dois meses os botijões de gás que ele obtinha com as trocas, supriria
sua necessidade pessoal e das casas de aluguel para o veraneio. Sobrariam 7
meses de acumulo de botijões. Tenho certeza que ele não só se julgava em pleno
direito de receber o subsídio na forma de vales-gás como também se sentia um
benfeitor da humanidade por revender os botijões de gás por uns centavos mais
barato, àqueles que, por ultrapassarem o teto de consumo por uns centavos, não
tinham direito ao beneficio.
Nada impedia que ele agisse daquela maneira. O programa
falhara em não antepor cláusulas que barrassem esse tipo de comportamento. O
que sobrava àquele senhor em casas e botijões faltava-lhe em dignidade.
Hoje, em minha cidade, a prefeitura tem um programa de
distribuição de cestas básicas às famílias carentes. Um dos postos de
distribuição fica perto de minha casa e, vez por outra, vejo as pessoas indo
buscar os produtos básicos de consumo. Só não posso afirmar que sejam carentes,
pois é comum ver carros que devem valer 12, 15, 20 mil reais com a mala aberta
para levar os gêneros que deveriam suprir as necessidades dos que nada têm.
O programa do subsídio do gás acabou faz tempo, talvez
devido aos desvios de finalidade. Quanto
às cestas básicas, continuarão sendo distribuídas sem nenhum critério sócio-econômico,
afinal quem as recebe quer que o programa continue e vota em quem os favorece.
E os votos são todos iguais. Tanto faz os dos carentes quanto os da classe
média sem vergonha na cara.
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