Garoto, muitas vezes deixei de
ir ao estádio por falta de grana pro ingresso. Aos 15, 16 anos eu convivia com
amigos de classe média que iam ao campo de carro com seus pais. Carona até que
rolava, grana não. Mas havia dias que a rapaziada resolvia ir ao Mineirão sem
um mango no bolso. Pegávamos carona na AV. do Contorno com outros torcedores e
nas bilheterias do estádio pedíamos a quem estava na fila pra comprar
ingressos, umas moedinhas para inteirar a entrada da geral. Se havia tempo,
aproveitávamos para arranjar o do cachorro quente e o da coca cola. Não
sentíamos que estivéssemos mendigando, apenas sendo espertos.
Estávamos nos bons tempos de
estádio cheio todo fim de semana, não importava o jogo, e a geral era baratinha.
No espaço democrático, íamos todos juntos, atleticanos e cruzeirenses.
Atleticanos, éramos o Xandico, o Ramé, o Dimas, o Marcos e eu. Cruzeirenses, o
Aníbal e o Maurinho.
Mas havia umas regras para a
entrada no Mineirão. Crianças menores de 7 anos não podiam entrar de maneira alguma e os que contavam entre 7 e
12 anos, só acompanhadas por adultos. Lembro de uma vez que tentamos dar uma
força pra uns moleques pequenos entrarem conosco. Não deu. Não éramos adultos.
Na época eu pensava que era uma
regra rigorosa demais. Punha culpa no autoritarismo da ditadura. Hoje eu sei
que essas regras estavam certíssimas, mas parece que só eu penso assim.
A cada domingo, antes e durante
a transmissão dos jogos pela TV, são mostradas muitas crianças e até bebês de
colo nas arquibancadas dos estádios. As câmeras as procuram e, pondo legendas
nas imagens, nossos locutores esportivos aproveitam para balbuciar frases que
vão da pieguice à imbecilidade. Fala-se do futuro torcedor, da presença da
família nos estádios e ai que lindo. Não é possível que essa gente
não tenha a menor noção das coisas. Parece que dão folga ao cérebro nos fins de
semana.
Lembro-me bem que quando meu filho estava por nascer, minha mulher e eu
líamos tudo que nos caía nas mãos sobre gravidez, bebês, crianças e etc. Creio
ter visto o mesmo entre outros pais de primeira viagem e uma das coisas que
gravei foi sobre a audição dos bebês. Pelo que me lembro, eles têm uma audição
perfeita. Ao contrário do que ocorre com a visão, por exemplo, a criança já
nasce com seu sistema auditivo funcionando perfeitamente. Eles escutam melhor
que os adultos.
Num estádio de futebol com
foguetórios, charangas e cantos da torcida, o bebê absorve o som que mesmo para
nós adultos seria insuportável não fosse por nossa paixão pelo time de coração.
Mas ao contrário de nós, os bebês não têm paixão por time nenhum e sofrem
gratuitamente.
Mesmo para uma criança que já
deixou o colo e a teta, que tenha 1, 2 ou 3 anos, que graça tem estar num lugar
quente, ruidoso e sem brinquedos? Acho
que nenhuma. Elas só estão lá pela estupidez dos pais que as fantasiam com a
camisa do time para que os idiotas da narração esportiva digam que lá está a
pequena vascaína ou o pequeno
cruzeirense. Esses pais, que deveriam ser admoestados pelo órgão de defesa das
crianças e adolescentes, não pensam que uma simples correria nas arquibancadas
poderia por em risco a vida de seus filhos, que um sinalizador é tóxico, que há
entre os torcedores os irascíveis e os brutais.
Que existem pais totalmente
irresponsáveis, todos sabemos. Mas em uma emissora de televisão há muitos
chefes, diretores, superintendentes, editores e o escambau. Será que nenhum
engravatado desses tem a menor responsabilidade? O menor discernimento? Ou seus
poucos neurônios só conseguem entrar em atividade quando se trata de índices de
audiência e faturamento comercial? Parece que é isso. Caso contrário haveria, ao
menos, alguma orientação para que as imagens com torcedores levando seus bebês
não fossem mostradas para se evitar a repetição, a imitação. O que ocorre é justamente o
contrário. Deve haver uma ordem superior para que operadores de câmeras e
diretores de imagem façam da estupidez paterna uma forma de atrativo.
Caberia então aos órgãos
governamentais estabelecer algum critério para o ingresso de crianças nos
estádios. Como está, me parece que é a crônica da tragédia anunciada.
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